Por que amamos quem amamos?
Porque é que, mesmo amando, desejamos outro?
E porque é que, tantas vezes, aquilo que devia aproximar-nos acaba por nos separar?
Quis saber tudo com o psiquiatra José Gameiro e especialista em amores e casos mau parados, separações e ressurreições relacionais
A comunicação é o fio invisível que sustenta o amor — e também o primeiro a romper-se quando a relação se gasta.
O tom muda, as palavras rareiam, o silêncio instala-se.
E, no entanto, é aí, nesse vazio, que o coração humano tenta reinventar o diálogo — consigo próprio e com o outro.
O episódio de hoje mergulha nesse território onde razão e emoção se confundem.
O nosso convidado é José Gameiro, psiquiatra, especialista em relações de casal e autor do romance O Outro — uma história que fala do desejo, da culpa e da busca impossível por completude.
Um romance sobre o que acontece quando o amor não chega, quando o quotidiano se torna demasiado previsível e o coração, insatisfeito, decide procurar sentido fora de casa.
Mas “O Outro” não é apenas uma narrativa sobre infidelidade.
É uma reflexão sobre o ser humano moderno — fragmentado, dividido entre o que sente e o que deve sentir.
E, sobretudo, sobre a forma como comunicamos dentro das nossas contradições: o que dizemos e o que calamos, o que confessamos e o que escondemos.
Porque os triângulos amorosos, no fundo, são também triângulos de comunicação.
Há sempre três vozes em conflito: a da verdade, a do desejo e a do medo.
Uma pede liberdade, outra pede pertença, a terceira tenta salvar a imagem que temos de nós próprios.
E é nesse campo minado que o amor contemporâneo tenta sobreviver.
Há quem pense que comunicar é escolher as palavras certas.
Mas comunicar é, acima de tudo, ter coragem para expor as nossas incoerências.
É suportar a nudez emocional de dizer “já não sei o que sinto”, e ficar ali — em silêncio — à espera que o outro não fuja.
Primeira lição:
O amor é uma língua que se fala com hesitação.
Não há gramática perfeita, nem tradução fiel.
As palavras envelhecem, os gestos mudam de sentido.
O que ontem significava amor, hoje pode soar a tédio.
Comunicar bem é aceitar que o idioma da intimidade tem de ser reaprendido todos os dias.
Segunda lição:
As relações não se quebram por causa do conflito, mas por falta de diálogo.
O não-dito é o verdadeiro veneno.
A omissão, o silêncio, a ausência emocional: são eles que corroem a ligação entre duas pessoas.
Gameiro recorda que não há pior solidão do que a de quem vive acompanhado, mas deixou de ser ouvido.
Terceira lição:
Amar não é possuir, é compreender.
Cuidar do outro é compreender o seu medo, a sua fadiga, a sua necessidade de espaço.
É saber rir no meio do caos, escutar sem interromper, aceitar que o amor também precisa de ar.
No fundo, esta conversa é sobre os dilemas universais da comunicação: o que acontece quando o discurso íntimo se esgota, quando o desejo se transforma em culpa, quando o humor desaparece e o silêncio se instala.
E é também sobre a redenção possível — o reencontro entre dois seres que aprendem a falar de novo, com menos certezas e mais ternura.
Porque o amor, como a linguagem, só existe enquanto é praticado.
Não há manual de instruções, mas há uma ética: a de tentar compreender o outro antes de se defender de si próprio.
E talvez seja essa a lição maior do episódio de hoje:
que comunicar é, sempre, um ato de amor.
E que o amor, quando se comunica mal, transforma-se num espelho estilhaçado — onde cada pedaço reflete uma parte de nós que ainda não aprendemos a escutar.
Neste episódio do Pergunta Simples, José Gameiro — psiquiatra, especialista em relações de casal e autor de O Outro — ajuda-nos a decifrar o amor, o desejo e o silêncio.
Falamos de triângulos amorosos, de empatia e das palavras que podem salvar uma relação.
Uma conversa sobre o que nos une, o que nos separa e o que ainda vale a pena tentar compreender.