Hoje falamos da mais profissional, eficaz e eficiente máquina de criação e gestão das expectativas: a política.
Usando as ferramentas da comunicação, os políticos de todo o mundo criam percepções favoráveis às suas causas.
São essas percepções que permitem um suporte da opinião pública para as posições e decisões que os políticos tomam no nosso nome.
E essa máquina das percepções obedece a regras e estratégias muito bem definidas.
Pelo menos assim era no tempo dos ‘media’ tradicionais.
Agora há um novo mapa a ser desenhado: o mundo alimentado pelas redes sociais.
Trocaram-se os editores e jornalistas por robôs e algoritmos.
E a comunicação política repensou a sua forma de fazer o que sempre fez: influenciar o pensamento da opinião pública.
Com um refrescado conceito chamado polarização. Não é novo. Mas está na moda.
Do telejornal às manchetes dos jornais.
Da voz na manhã da telefonia até aos programas de debate.
Do contacto direto com os cidadãos até à transmissão em direto de eventos criados precisamente para serem transmitidos.
E agora as redes sociais: o velhinho Facebook onde todos continuamos a estar.
O Twitter agora batizado de X, por onde correm as mais disputadas e virulentas discussões políticas e sociais. Ou mesmo o Instagram e o TikTok, lançados para criar atenção pela beleza da foto-autorretrato ou da dança da moda, entretanto transformadas em máquinas de ‘marketing’ directo.
Estes dois mundos são o palco do mundo moderno.
E quem deseja mandar no mundo, no planeta, do país, município, aldeia ou grupo sabe que tem de usar estes canais e criar receitas que nos agradem.
Este programa é sobre o cruzamento da arte da comunicação com o da política.
Numa frase: a comunicação política e a política na comunicação.
A convidada é Susana Salgado, investigadora deste campo do saber no Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
Exploramos como os media e as redes sociais desempenham um papel crucial na maneira como as pessoas entendem a política e tomam decisões.
A conversa aborda temas como a polarização, o efeito dos algoritmos das redes sociais e o impacto dos preconceitos cognitivos, que criam uma espécie de “bolha” em que cada um de nós vive, condicionando como recebemos e interpretamos as mensagens políticas.
Um dos principais pontos de reflexão neste episódio é o impacto da comunicação polarizadora. Segundo ela, a política contemporânea tende a afastar os cidadãos do debate e a empurrá-los para os extremos, limitando a capacidade de entendimento e troca de ideias. Ela explora como, muitas vezes, os temas mais sensíveis ou “incómodos” são excluídos da discussão pública, não por falta de relevância, mas por uma espécie de censura social.
Isso faz com que pessoas que partilham de opiniões não convencionais sejam empurradas para a margem, onde encontram espaço em movimentos ou partidos mais radicais.
Esse fenómeno é reforçado pelas redes sociais, onde o anonimato e a liberdade de expressão permitem que as pessoas exponham visões mais extremas do que fariam em interações presenciais.
Nesta conversa aprendi muito sobre o conceito de criação de agendas públicas.
Em particular, como criar estratégias para colocar o nosso tema na agenda e criar percepções favoráveis ao nosso ponto de vista.
Criar agenda, enquadrar factos e apontar o foco de luz para o que mais no interessa.
Ou criar distrações para desviar a atenção geral para o que não nos interessa discutir.
Susana Salgado explica como estas estratégias ajudam a moldar as perceções dos cidadãos, enfatizando certos temas e desviando a atenção de outros.
Estes mecanismos são, segundo ela, particularmente eficazes para criar uma “máquina de perceções” onde o que ganha é visibilidade mediática, interpretada como sendo mais relevante, muitas vezes à custa de temas de interesse real para a população.
Nem sempre a resposta é directa e fácil.
Sabendo destes mecanismos do uso da comunicação poderemos conhecer melhor como funciona a opinião pública. Como reage. Como suporta ou nega propostas de decisão, ou ideias políticas.
Sabendo que muitas das mais importantes decisões são muitas vezes mal percepcionadas. E outras, muito vistosas, são pouco relevantes.
Há uma coisa onde política e a comunicação tem em comum: o tempo, o timng.
Não adianta ter razão antes do tempo ou explicar tarde demais.
00:00:00:00 – 00:00:34:00
JORGE CORREIA
Viva. Susana Salgado, professora, investigadora e uma especialista no uso da comunicação política no melhor, é uma especialista no uso da comunicação por parte dos políticos e também da maneira como nós vemos política na comunicação. No fundo, como é que nós, em casa, quando ligamos o telejornal, quando vamos à internet, percecionamos aquelas pessoas que ali estão do outro lado, que são os políticos ora candidatos a um determinado cargo, ora já noutro mercado, explicando nos a nós cidadãos, o que andam a fazer da vida.
00:00:34:01 – 00:00:52:10
SUSANA SALGADO
E isto é exatamente a forma como os políticos, seja em que função for, como candidatos ou já eleitos ou como oposição, utilizam a comunicação para fazer passar as suas mensagens ou as mensagens que eles querem que a opinião pública saiba sobre.
00:00:52:10 – 00:01:06:24
JORGE CORREIA
Eles é que são e como é que são os políticos. Conte nos lá como é que alguém que é da investigação observa os políticos são bons comunicadores. Depende dos envolvidos na empresa.
00:01:06:24 – 00:01:15:11
SUSANA SALGADO
Uns que são melhores, que são melhores comunicadores que outros, sem dúvida. A pergunta é demasiado abrangente para lhe dar uma resposta.
00:01:15:11 – 00:01:22:14
JORGE CORREIA
Só então como é que nós poderíamos definir um bom comunicador? E na política em específico.
00:01:22:16 – 00:01:40:11
SUSANA SALGADO
E como seria por dizer, é que a comunicação é muito importante e às vezes quase que faz milagres. Mas não é tudo. Porque se a mensagem estiver desfasada daquilo que que as pessoas querem ouvir ou daquilo que as pessoas precisam de ouvir. A comunicação quer dizer não vai, não vai resolver.
00:01:40:17 – 00:01:49:04
JORGE CORREIA
Falas, falas, falas bem, mas não me encantas. No fundo não me está a chegar ao coração. Não estás a chegar às minhas dores aquilo que me está a preocupar neste momento.
00:01:49:06 – 00:02:10:05
SUSANA SALGADO
Há algo como isso. Sim, porque na prática, um bom comunicador não é só alguém que transmite uma mensagem, é também alguém que sabe ouvir e que sabe ler aquilo que é o ambiente e acaba por, no fundo, incorporar isso naquela que é a sua mensagem.
00:02:10:07 – 00:02:23:02
JORGE CORREIA
Portanto, em princípio, um bom comunicador é um bom ouvinte. Entenda se um bom político. O comunicador será alguém que tem uma boa capacidade de ouvir. Isto é uma intuição ou é uma ciência?
00:02:23:04 – 00:02:57:17
SUSANA SALGADO
A ciência é difícil. Quer dizer, nós tentamos que seja em termos da análise que se faz gente. E quer dizer, eu imagino que as campanhas, por exemplo, as mais sofisticadas, tentem fazer disto o mais possível uma ciência, porque, no fundo, o objetivo é convencer o maior número de pessoas e ganhar eleições. Portanto, quanto mais simples for interpretar a aquilo que são as pistas e depois saber qual é o percurso a fazer melhor.
00:02:57:23 – 00:03:15:03
SUSANA SALGADO
Agora não é uma ciência exata. Isso não podemos dizer que é porque as pessoas são diferentes. A forma como reagem as mensagens são diferentes. As pessoas têm processos de socialização completamente diferentes, têm experiências de vida que depois têm efeitos na forma como recebem as mensagens.
00:03:15:03 – 00:03:28:13
JORGE CORREIA
Isso é uma espécie de micro bolhas. Cada um de nós está numa espécie de bolha. Eu, os meus amigos, a minha família, o meu estatuto social e económico condiciona desde logo a maneira como eu recebo uma mensagem.
00:03:28:15 – 00:03:58:11
SUSANA SALGADO
Condiciona, sem dúvida, a experiência da pessoa, a própria vivência, a forma como a pessoa como um indivíduo percebe aquilo que é, porque é assim a determinada. As pistas que são dadas, algumas de forma subliminar, outras de forma mais direta que as pessoas captam, muitas vezes têm consciência disso, muitas vezes não têm consciência disso. E depois a forma como vão interpretar aquilo que recebem.
00:03:58:13 – 00:04:36:09
SUSANA SALGADO
No fundo, é afetado por todos esses pequenos sinais que já estão, que já lá estão. Por exemplo, se nós pensarmos nas nas vestes que usas as pistas que as pessoas têm, os partidos, a ideologia, podem ser vistas como Isso porque uma pessoa, por exemplo, que se diz de esquerda e que foi socializada à esquerda, muito dificilmente vai concordar com uma mensagem de um político que é de direita, assumidamente de direita, ainda que claro que imaginando que essa mensagem vai ao encontro daquilo que é.
00:04:36:13 – 00:05:01:19
SUSANA SALGADO
Ou seja, há aqui um uma espécie de uma reacção que é condicionada à partida. Depois há os denominados motivo de riso, ou seja, as pessoas. Por natureza, o processo cognitivo tenta excluir tudo aquilo que são informações que não confirmam aquilo que nós já sabemos ou aquilo que nós já pensamos que é assim.
00:05:01:19 – 00:05:26:12
JORGE CORREIA
É uma espécie de preconceito, não preconceito no sentido de preconceito, Isto é, conceptualmente eu vejo o mundo desta maneira e, portanto, em princípio, se alguém vê de uma maneira diametralmente oposta e eu tento desde logo tendo a excluir isso como alguém, é quase um sentimento de que tu não fazes parte da minha tribo.
00:05:26:14 – 00:05:59:11
SUSANA SALGADO
Pode ser. Pode. Pode chegar, pode chegar a isso, mas não é. Não, não é tanto logo de início. São pessoas, são processos cognitivos que existem em todos nós, porque são formas do cérebro conseguir, no fundo, fazer sentido de muita informação, porque é impossível para nós, biologicamente. E agora com a internet, ainda mais. Assimilar toda a informação e muitas vezes a informação completamente dissonante, não é.
00:05:59:13 – 00:06:21:02
SUSANA SALGADO
Portanto, há aqui pequenas pistas que cada um de nós segue, mas isto quer dizer que faz sentido. As pessoas são assim, todas são assim. Naturalmente. Há algumas que têm mais consciência disso e depois, eventualmente, elas próprias ficam mais abertas a receber ideias diferente e outras têm menos consciência disso e que se fecham naquilo que podia dizer a tal bolha.
00:06:21:04 – 00:06:30:00
SUSANA SALGADO
Mas não é uma coisa intencional, não é? Faz parte. Faz parte do processo cognitivo de lidar com a informação, que muitas vezes é informação dissonante.
00:06:30:02 – 00:06:54:07
JORGE CORREIA
Quando nós tentamos ouvir aquilo que as pessoas pensam. E hoje é muito interessante porque não é só na política, mas nas organizações isso acontece. A palavra em inglês é feed back e no fundo diz me lá o que é que estás a sentir, O que é que estás a pensar? Olhando para o cruzamento entre o que é a vida real, aquilo que nos perguntam e aquilo que nós respondemos.
00:06:54:09 – 00:07:08:10
JORGE CORREIA
Há aqui um índice de simulação ou de mentira quando alguém tem que responder, por exemplo, aos políticos ou para os políticos por via das sondagens ou não, só aquilo que pensa e sente verdadeiramente.
00:07:08:12 – 00:07:33:08
SUSANA SALGADO
Mas depende das situações, naturalmente, depende das situações. Haverá situações em que algumas pessoas preferem não dizer simplesmente aquilo que pensam. Por exemplo, no caso de de de candidatos que não são politicamente corretos, para usar esta expressão, se calhar as pessoas terão algum prurido em assumir que apoiam ou que eventualmente vão votar, ou que concordam com alguma coisa que aquele candidato ou com aquele político está a dizer.
00:07:33:10 – 00:08:11:13
SUSANA SALGADO
Nós vemos muito isso agora. Quer dizer, não só noutros países, mas vemos. Vemos isso muito em Portugal também, porque haverá pessoas que se calhar, imagino eu, não nunca pensaram em votar. Não chega, mas que até concordam com algumas coisas que por vezes o André Ventura diz. E nesse caso, provavelmente se forem perguntar em público ou alguém que seja fora do seu círculo, mais o mais privado, provavelmente vão dizer não vão ser absolutamente sinceros porque preferem não entrar em explicações até porque muitas vezes é difícil explicar o porque.
00:08:11:15 – 00:08:44:03
SUSANA SALGADO
Quando nós vivemos em ambientes mais polarizados, existe esta ideia de que. Aquilo que aquele que não pensa como eu é um inimigo ou é estúpido, ou é ou é, enfim, ou é alguém que que, que tem uma visão completamente diferente do mundo e portanto, é impossível haver aqui um ponto de contacto e em alguns, alguns casos, algumas situações é possível imaginar que as pessoas prefiram simplesmente não dizer a verdade sobre aquilo que pensam.
00:08:44:03 – 00:09:19:16
JORGE CORREIA
Isso é uma vergonha de assumir o que se pensa. É um medo de ser julgado pelos outros que o que é que pode estar a em cima da mesa, Isto é, se alguém está a ouvir um candidato lá está pouco politicamente correcto, para dizer o mínimo, a defender uma ideia xenófoba ou racista ou manifestamente exagerada, faz com que estes eleitores ou cidadãos não se sintam confortáveis até por concordarem com aquilo.
00:09:19:18 – 00:10:00:06
SUSANA SALGADO
Existe. No fundo, eu às vezes fico a pensar nisto. É difícil explicar, mas existe muitas vezes em democracia. Um tipo de procedimentos que são pouco democráticos, que é a ideia de que há determinados temas que não se podem discutir. Provavelmente agora já todos nos esquecemos disso, porque aconteceram tantas coisas más no início deste ano. Simplesmente quem trazia o tema da imigração para a esfera pública era em media altamente apelidado de xenófobo, racista, etc.
00:10:00:08 – 00:10:13:21
SUSANA SALGADO
Isto em democracia é inaceitável porque em democracia aquilo que nós esperamos é que todas as pessoas tenham a mesma oportunidade de.
00:10:13:23 – 00:10:47:11
SUSANA SALGADO
Exteriorizar as suas ansiedades ou as suas opiniões, mas que naturalmente, existem limites legais para aquilo que nós temos, que aquilo que é designado como discurso de ódio, etc. Não estou a falar disso. Estou a falar simplesmente de falar, de haver abertura para falar de assuntos que provavelmente não preocupam os políticos, mas preocupam ou não preocupam os políticos mainstream, mas preocupam algumas pessoas e via.
00:10:47:13 – 00:11:08:00
SUSANA SALGADO
Houve momentos em que claramente alguém que dissesse alguma coisa sobre imigração, agora já quer dizer, agora já existe o rótulo de imigração descontrolada, etc, etc. Prontus, já fala abertamente. Concorde se ou não, isso é outra questão.
00:11:08:00 – 00:11:17:01
JORGE CORREIA
Mas inicialmente quem levantasse a questão era era no fundo por um lado rotulada automaticamente e condicionada na sua liberdade de expressão.
00:11:17:01 – 00:11:37:23
SUSANA SALGADO
Completamente, era imediatamente. Ou seja, esta pessoa porque está a levantar esta questão é xenófoba. Ponto. Ou seja, não havia sequer espaço para haver uma discussão mais aberta sobre aquilo que era a perceção daquela pessoa errada ou não pode estar errada. Mas a questão é que em democracia as opiniões são válidas.
00:11:38:00 – 00:11:57:24
JORGE CORREIA
E isso parece me que o politicamente correto está perigosamente próximo do fascismo. Não no sentido, no sentido conceptual, que é. Não podes ter uma opinião que seja divergente daquilo que quem pensa intelectualmente isto seja mais aceitável ou menos aceitável.
00:11:58:01 – 00:12:27:11
SUSANA SALGADO
Isso é normalmente o que a polarização faz a política e nós, apesar de muitas vezes nós pensamos que porque temos. No fundo, políticos, partidos mainstream ganhar eleições, que não existe polarização nos debates políticos. A questão é que, ao excluir uma camada importante da população de comunicar, será que estamos a falar de comunicação, de comunicar aquilo que são as suas opiniões ou de não dar espaço?
00:12:27:11 – 00:13:04:19
SUSANA SALGADO
Estamos imediatamente a empurrá los para as margens. Estamos imediatamente a empurrá los para estes partidos radicais. Esses, muitas vezes sim, têm visões daquelas que nós conhecemos. E aquilo que acontece é que, em vez de nós estarmos a. Promover uma espécie de encontro ao centro, de dar espaço àquilo que são opiniões diferentes e haver espaço para debate e, eventualmente, até convencer as pessoas, porque assim, de facto, não existe problema com a imigração.
00:13:04:19 – 00:13:18:09
SUSANA SALGADO
É fácil convencer essas pessoas com uma discussão e não digo só racional, com uma discussão, com factos e com argumentos de que não existe. Porque é que isso impede que as pessoas falem? É isso que é isso que não é democrático?
00:13:18:09 – 00:13:23:10
JORGE CORREIA
Que incómodo! Porque o problema é demasiado difícil para obter respostas.
00:13:23:12 – 00:13:58:05
SUSANA SALGADO
Não por causa de determinadas pessoas do outro lado, porque nós temos. Ou seja, nós temos o debate extremado e há determinados temas que são conotados com uma parte e uma parte que radical de um lado, e que o facto de eventualmente virem a público ensaios sobre isso são imediatamente empurrados para aquele canto, porque o outro lado não deixa.
00:13:58:09 – 00:14:08:10
SUSANA SALGADO
Ou seja, os extremos. Normalmente isto quer em ciência política, quer, enfim, os extremos normalmente são semelhantes, não nas suas ideias, mas nas formas de actuação.
00:14:08:10 – 00:14:09:10
JORGE CORREIA
E nos seus métodos.
00:14:09:12 – 00:14:20:03
SUSANA SALGADO
Exatamente e na própria comunicação. A forma como se exclui a voz do outro, porque o outro é diferente é muito comum nos extremos, seja de que lado for.
00:14:20:06 – 00:14:36:00
JORGE CORREIA
Então, na ótica de uma cientista da comunicação política, o que que está a acontecer para que estes fenómenos da polarização e da exclusão do outro se tenham intensificado tanto nos últimos anos?
00:14:36:02 – 00:14:44:10
SUSANA SALGADO
Há vários motivos. Não há um único motivo. Há muitas pessoas que apontam.
00:14:44:12 – 00:15:09:21
SUSANA SALGADO
A inovação tecnológica, nomeadamente as redes sociais, como essencialmente o motivo para uma maior polarização, contribui de facto. A questão aqui é nós vemos uma correlação, mas esta correlação não é necessariamente uma causa efeito? Pode ser, mas não é necessariamente uma causa efeito.
00:15:09:23 – 00:15:20:07
SUSANA SALGADO
Mas há outros, porque, no fundo, a tecnologia é uma tecnologia usada por uns e por outros. Portanto, pode ser usada para uma coisa e para outra.
00:15:20:09 – 00:15:47:05
JORGE CORREIA
Mas há aí um bichinho aí no meio que se chama algoritmo, que não é assim tão neutro como, como nós podemos imaginar. Sim, o seu objetivo principal do algoritmo das redes sociais é aprendermos o máximo de tempo possível dentro das redes sociais e vender depois produtos que que lá estão. O que significa que as redes sociais, enquanto o grande ecoar da comunicação, têm todo o interesse do mundo em que haja bastante zaragata?
00:15:47:07 – 00:16:07:03
SUSANA SALGADO
Completamente, porque esse é o seu modelo de negócio, não é tudo aquilo que tem a ver com conflito, com choque, aquilo que choca, aquilo que provoca maiores reações, aquilo que no fundo, acaba por. Colar as pessoas a o que se está a passar, as interações.
00:16:07:03 – 00:16:24:01
JORGE CORREIA
E eu vou ficar aqui mais tempo porque olha, isto agora está se zangar agora por este comunicador. Isto irrita me, apaixona me, portanto tem que estar lá e eu até tenho vontade de ir lá dar uma pantufada no Nuno A ou no B. Ao contrário de uma coisa que dizem olha, isto é um belo lago azul com os cisnes cor de rosa já não me interessa.
00:16:24:01 – 00:16:32:16
JORGE CORREIA
Vou me embora. Há uma tensão narrativa que é deliberada para nos agarrar.
00:16:32:18 – 00:16:44:17
SUSANA SALGADO
A uma tentativa de evidenciar elementos específicos, performativos, de conflito. Porque isso, isso já estou perdido.
00:16:44:19 – 00:16:51:09
JORGE CORREIA
O que é que são? O que são esses e o que é uma lanterna e um foco apontado para determinadas ideias ou pessoas?
00:16:51:11 – 00:17:21:17
SUSANA SALGADO
E a forma como as pessoas são direcionadas para determinada sítios, por um lado, e a forma como a própria comunicação online acaba por. Não é igual comunicar em presença de comunicar online, as pessoas sentem se muito mais à vontade a dizer todo o tipo de coisas online porque não têm uma pessoa frente a frente do que em presença.
00:17:21:17 – 00:17:29:02
SUSANA SALGADO
Não é porque seja ofender, seja eventualmente expressar opiniões que são mais radicais, seja.
00:17:29:02 – 00:17:30:20
JORGE CORREIA
Difamar.
00:17:30:22 – 00:18:02:11
SUSANA SALGADO
Seja difamar. É exatamente. E depois há a questão do anonimato também, que também promovo. Enfim, que mesmo que não seja permitido, há formas de contornar. Não é, por assim dizer, que as pessoas podem assumir nicknames, etc, etc. Portanto, tudo isto acaba por haver muito mais liberdade para as pessoas que se calhar se sentiriam constrangidas em presença a dizer que dizem de forma muito mais simples online.
00:18:02:12 – 00:18:05:19
JORGE CORREIA
A democracia pode estar a sair de moda.
00:18:05:21 – 00:18:39:19
SUSANA SALGADO
Se continuar como está, com falta de transparência e com, no fundo umas coelha de temas que são um bocadinho ao lado daquilo que a maioria das pessoas no fundo, queria ver resolvido. Poderá, Infelizmente poderá, porque nós vamos. Vamos ver. No fundo, gerações mais novas a votar de forma completamente diferente. A Há pessoas, aliás, em todos, em todos. Todos.
00:18:39:21 – 00:18:59:01
SUSANA SALGADO
Nos Estados Unidos, por exemplo, fizeram inquéritos antes de, no período antes de antes da campanha, em que havia um número crescente de jovens, não só jovens, mas os jovens são são um grupo importante aqui que dizia simplesmente que não se revia nenhum dos partidos.
00:18:59:03 – 00:19:00:18
JORGE CORREIA
Portanto, sentem se fora do sistema.
00:19:00:20 – 00:19:24:08
SUSANA SALGADO
Exatamente, que sentiam a necessidade de haver um terceiro partido, ou seja, este esta alternância de um e outro para eles não serve porque eles não se sentem representados. Portanto, eles sentiam a necessidade de um terceiro partido. Nós vemos isso aqui também em Portugal. Muitas pessoas dizerem que voltaram a ter interesse pela política quando surgiram partidos novos.
00:19:24:10 – 00:19:49:10
JORGE CORREIA
Aconteceu no PRD, aconteceu no grande crescimento do Bloco de Esquerda numa determinada altura. Aconteceu. Agora não chega. Há sempre um espaço para um partido que tem ali 10 a 15% dos eleitores, cujo mantra principal é fazer ressoar exactamente o protesto, ou pelo menos, as pessoas que não se sentem bem têm ali uma casa.
00:19:49:12 – 00:20:02:19
SUSANA SALGADO
Exatamente. Agora, a questão é nós vemos isso, mas também vemos as votações dos partidos tradicionais mainstream a diminuírem.
00:20:02:21 – 00:20:08:13
JORGE CORREIA
E isso é um sinal ou estado dessa ilusão, dessa incapacidade de ouvir.
00:20:08:15 – 00:20:50:00
SUSANA SALGADO
É um sinal. Claramente é um sinal da falta de transparência. É um sinal de haver, no fundo, formas de fazer política que não vão ao encontro daquilo que são, por um lado, as necessidades de comunicação. Mas vai além disso, que é, no fundo, ouvir aquilo que as pessoas, as gerações mais novas. Por exemplo, a questão de clímax é um excelente exemplo da forma como um grupo de jovens podemos depois discutir se são controlados por alguém ou não.
00:20:50:06 – 00:20:51:03
SUSANA SALGADO
Isso é outra questão.
00:20:51:03 – 00:21:20:19
JORGE CORREIA
Mas para enquadramento das pessoas, é um grupo que fez um conjunto de ações pintando montras de empresas e acabou a pintar o cabelo do primeiro ministro Luís Montenegro. Portanto, era um grupo que queria chamar a atenção para as questões ambientais e para a maneira como nós estamos a destruir o planeta. Estamos não mais que essa linguagem radical. E eles não foram, não foram enquadrados nem ouvidos foi foram colocados na borda do prato.
00:21:20:21 – 00:21:57:07
SUSANA SALGADO
É porque é assim. Este é um grupo, um pequeno grupo, não é? Mas no fundo é um reflexo daquilo que gerações mais jovens pensam. Não são só aquela meia dúzia de pessoas que se vão sentar no meio da estrada ou que enfim, atiram a tinta para tratar alguém. São, são no fundo, representativos daquilo. Um sintoma são as preocupações das novas gerações que não estão de todo a ser ouvidas e que isto pode trazer, de facto, porque as pessoas depois quer dizer, pensam esta estas novas gerações não têm de facto nenhuma memória de ditadura, não é isso?
00:21:57:08 – 00:22:01:24
SUSANA SALGADO
Quer dizer, eventualmente podem ler em livros, mas é diferente e.
00:22:01:24 – 00:22:03:10
JORGE CORREIA
Podem perder a fé.
00:22:03:12 – 00:22:04:24
SUSANA SALGADO
Na democracia.
00:22:05:01 – 00:22:05:20
JORGE CORREIA
E esse é o ponto.
00:22:06:01 – 00:22:07:05
SUSANA SALGADO
Exatamente.
00:22:07:07 – 00:22:29:18
JORGE CORREIA
Bom. Os grandes partidos em todos os países do mundo, pelo menos nos democráticos, tentam sempre fazer uma coisa para atrair os votos, para conseguirem o poder. Por um lado, fazer um agendamento, um agenda setting. O que é que são os temas que eu vou colocar na agenda para conseguir fazer a liderança política e por outro, até enquadrar, tentar colocar ali dentro da sua caixinha normativa o que é que vai acontecer.
00:22:29:24 – 00:22:53:04
JORGE CORREIA
E depois um curioso fenómeno que sabe os nomes. Vocês fazem isso todos os dias. Chama lhe priming, é a expressão em inglês. Eu posso pôr uma etiqueta nova, foco de luz, que é onde é que nós vamos apontar e apontar a luz? Por que que estas três coisinhas, o agendamento do enquadramento e a tal priming são importantes? O que isto do priming?
00:22:53:04 – 00:22:54:15
JORGE CORREIA
Em primeiro lugar.
00:22:54:17 – 00:23:24:18
SUSANA SALGADO
Isto são formas, são efeitos de mídia e são formas possíveis, entre outras. Não são as únicas, mas são formas possíveis de influenciar. Influenciar eleitores ou influenciar a forma como as pessoas vêem determinadas políticas, determinados políticos, através de no fundo deste. Conhecendo a forma como os efeitos dos media funcionam sobre as audiências.
00:23:24:18 – 00:23:27:14
JORGE CORREIA
É uma máquina de criação de perceções.
00:23:27:16 – 00:24:00:10
SUSANA SALGADO
A. E sempre Não é porque no fundo é sempre Porque é que acaba por ganhar quem tem uma melhor leitura daquilo que se passa e de quem tem uma. Uma melhor utilização dos media é porque, no fundo, a. Quer dizer, há imensa informação a circular, as pessoas não conseguem registar tudo e se algumas coisas forem no fundo sublinhadas, se algumas coisas forem.
00:24:00:12 – 00:24:06:05
SUSANA SALGADO
Ganharem uma saliência diferente em relação às outras, essas coisas passam a ter mais importância para as pessoas.
00:24:06:06 – 00:24:15:12
JORGE CORREIA
Aparecer aqui, se aparecer acolá. Se eu ver na notícia sobre no jornal, se eu vejo na televisão, se na rádio estão a falar sobre isto, em princípio isto é importante e deve preocupar me. Devo ocupar me.
00:24:15:14 – 00:24:31:10
SUSANA SALGADO
Exatamente isto, para além, naturalmente, da própria experiência pessoal da pessoa. Quer dizer, não é, não é indiferente a que ver as dificuldades que as pessoas têm de chegar ao fim do mês de pagar as suas contas.
00:24:31:12 – 00:24:56:12
JORGE CORREIA
A realidade irá também. Então, se eu quiser fazer uma pergunta claramente distorcida, diria então que o futebol, esse ópio do povo, é um belíssimo exemplo de como se nos ocupa a nossa cabeça num tema que é claramente lateral a nossa existência finita. Mas nós temos tanto tempo para discutir porque é que o Benfica, porque é que o Porto então, é o penálti, o jogador.
00:24:56:14 – 00:25:05:22
JORGE CORREIA
E enquanto discutimos isso, estamos distraídos, sem pensar naquilo que é mais importante e mais fundamental.
00:25:05:24 – 00:25:22:19
SUSANA SALGADO
Isso sim é dar uma resposta menos politicamente correcta sobre isso. Mas sim, acho que de facto. Quer dizer, eu sei, eu sei, sei sentar a querer ofender os as pessoas que gostam muito de futebol e que somos as audiências desses programas. Eu acho que é um bocadinho exagerado.
00:25:22:19 – 00:25:53:10
JORGE CORREIA
De facto. É curioso porque eu falo do futebol e não. E não é à toa, porque quando quando a Suzana fala de polarização, eu não consigo deixar de imaginar que aqueles bons programas de conversa sobre futebol vivem precisamente à conta de polarização. Tu que és do Benfica e que eu sou do Sporting, tu que és do Porto e as discussões inacreditáveis sobre coisa nenhuma que eles têm e prendem audiências fabulosas?
00:25:53:12 – 00:26:16:20
SUSANA SALGADO
E a questão da emoção e a questão do conflito? Isto tudo são regras? São, aliás, são regras antigas. E a própria literatura segue isto. Portanto, não é nada de novo no fundo, uma aplicação daquilo que são as regras normais para captar as regras mais conhecidas, para captar a atenção das pessoas.
00:26:16:22 – 00:26:34:12
JORGE CORREIA
Agora ou até agora. Nós tínhamos um universo mediático, tínhamos jornalistas, rádios, televisões, jornais. Vi com preocupação que nos Estados Unidos a credibilidade dos media e dos jornalistas caiu a pique. E pergunto se.
00:26:34:14 – 00:26:53:14
JORGE CORREIA
Estamos a passar de um sistema que tinha, de alguma maneira, algum controlo editorial, alguma, algum filtro para um sistema que é o das redes sociais, onde o filtro é inexistente e, portanto, a corrente de água irá para qualquer um dos lados, sem qualquer norma, sem qualquer responsabilidade.
00:26:53:16 – 00:27:38:20
SUSANA SALGADO
E sim, exatamente isso é preocupante. Isso é uma diferença e uma diferença em relação ao passado, que é preocupante porque mesmo quando existia conflito antes da internet, das redes sociais, existiam instituições. Existia uma forma de garantir uma espécie de uma concordância com uma realidade partilhada, por assim dizer. Ou seja, havia uma espécie, havia alguns, alguns árbitros, por assim dizer, que mantinham a credibilidade dos factos que, mesmo que as opiniões divergiam em determinado momento, havia um ponto de encontro em relação àquilo que era no fundo, a realidade.
00:27:38:22 – 00:28:12:15
SUSANA SALGADO
Isso está se a perder, está se a perder por vários motivos. Um deles é precisamente a falta de credibilidade dos habituais gatekeepers por campanhas que que pretendem isso mesmo. Por um lado, há atores políticos que funcionam muito assim. No fundo, a erosão do sistema também. Quer dizer, não é só a erosão da credibilidade no sistema político e em todas as instituições que, no fundo, sustentam aquilo que é o sistema político conhecido.
00:28:12:17 – 00:28:15:23
JORGE CORREIA
É uma ilusão de todas as instituições como os conhecemos hoje.
00:28:16:03 – 00:28:18:10
SUSANA SALGADO
Como os mediadores. No fundo.
00:28:18:12 – 00:28:33:01
JORGE CORREIA
És tu quem regula, quem media quem pode, quem quem medeia, quem pode, de alguma maneira, pôr aqui um travão. Um acelerador tende a ser descredibilizado para abrir campo para a discussão mais populista, mais polarizada.
00:28:33:03 – 00:29:08:15
SUSANA SALGADO
Tende a ser descredibilizado, por um lado, como uma estratégia, precisamente. Por outro lado, porque o sistema não funciona com as regras complexas da realidade comunicacional dos nossos dias, Porque nós temos os meios de comunicação tradicionais, órgãos de informação tradicionais, um bocadinho a reboque daquilo que se passa nas redes sociais, temos os órgãos de informação Não conseguir fazer fact checking daquilo que daquilo que é aquilo que se dissemina nas redes sociais.
00:29:08:15 – 00:29:10:04
JORGE CORREIA
Demitiram se.
00:29:10:06 – 00:29:44:12
SUSANA SALGADO
Eu acho que é incapacidade. No fundo, dado os meios que têm, é, no fundo também uma leitura que é um bocadinho incorrecta da forma que é o papel do jornalista em determinados momentos. Porque é assim, nós temos a informação a circular livremente. Não é? Tem que haver uma reflexão sobre aquilo que é o papel do jornalista em relação a essa situação em concreto, não é vir descredibilizar os atores políticos, porque isso cria polarização.
00:29:44:13 – 00:29:54:20
SUSANA SALGADO
nós não estamos aqui a dizer que as pessoas são uma massa uniforme, que vão todas reagir da mesma maneira e que coitadinhas têm que ser protegidas disto.
00:29:54:22 – 00:30:15:22
SUSANA SALGADO
Quer dizer, nós vivemos em democracia. Temos que esperar que as pessoas, no fundo, temos que lhes dar informação e temos que lhes dar educação, Que as pessoas consigam naturalmente elas próprias perceber as coisas por si. Não temos que estar a dizer às pessoas o que é que elas vão pensar agora. Existe de facto o risco e esse risco.
00:30:15:24 – 00:30:43:20
SUSANA SALGADO
Tem se agravado de os denominados políticos tradicionais continuarem a fazer aquilo que sempre fizeram e não olharem para aquilo que se passa à sua volta. E com esse risco, as regras democráticas, aquilo que normalmente nós considerávamos, quer dizer, a estrutura da nossa sociedade, podem perder e podem perder relevância.
00:30:43:20 – 00:31:04:10
JORGE CORREIA
Então, se daqui a cinco minutos o telefone da Susana tocar e nesta sequência, nesta ordem ou na ordem inversa, Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos de telefonar em dizer agora o que é que a gente faz à nossa vida? Que conselho é que daria aos dois mais importantes políticos do centro político português?
00:31:04:12 – 00:31:06:19
SUSANA SALGADO
Não, isso não posso dizer. Então não.
00:31:06:21 – 00:31:07:19
JORGE CORREIA
Seria tão.
00:31:07:21 – 00:31:08:09
SUSANA SALGADO
Claro.
00:31:08:10 – 00:31:09:07
JORGE CORREIA
Nem lá de casinha.
00:31:09:09 – 00:31:21:05
SUSANA SALGADO
Então, mas isso é assim, isso vou dizer. Os dois anulam completamente. E eu espero que a minha relevância Como, Como? Como? Como especialista de comunicação.
00:31:21:07 – 00:31:23:06
JORGE CORREIA
Susana Salgado Muito obrigada.
00:31:23:08 – 00:31:26:05
SUSANA SALGADO
Obrigada. Eu.
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