O que é que Rabo de Peixe nos ensina sobre comunicar melhor? Augusto Fraga

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O que é que Rabo de Peixe nos ensina sobre comunicar melhor? Augusto Fraga
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Hoje viajamos até Rabo de Peixe, ilha de São Miguel, Açores. A série que levou a vila ao mundo nasceu de um facto real — um veleiro em apuros e fardos de cocaína a dar à costa, em 2001 — mas o que nos interessa aqui não é a crónica policial. É a linguagem com que contamos um país. É a força de uma história bem filmada a iluminar desigualdades, sonhos, culpa e redenção.

Por isso, perguntamos: O que é que Rabo de Peixe nos ensina sobre comunicar melhor? Augusto Fraga.

Convidámos Augusto Fraga, criador e realizador de Rabo de Peixe, para uma conversa que começa na televisão e desemboca onde deve: na vida. Falamos de mérito e destino — porque nem todos partem da mesma linha —, da relação entre paisagem e personagem, e de como a verdade emocional dos actores só acontece quando a câmara “sabe o que pensamos”. Falamos da exposição (a pública e a íntima), dos limites entre cinema e série, do que significa dirigir actores jovens ao lado de nomes consagrados, e de como se filma um naufrágio quando o mar é um personagem sem nome.

Este episódio tem alerta de spoilers. Se ainda não viram a série, podem guardar esta conversa para depois. Mas se ficarem, dificilmente escapam à vontade de maratonar — não apenas pelo enredo, mas pelo que o enredo diz de nós: a vontade de torcer a sorte quando o mundo parece ter sido distribuído com uma régua torta.

Entramos, por isso, no coração comunicacional de Rabo de Peixe:

— A escolha deliberada de um registo vivo, onde as asneiras não são gratuitidade, mas pontuação de realidade;

— A decisão de proteger o sotaque em vez de o caricaturar;

— A escrita em sala de guionistas, que transforma uma ideia numa máquina de suspense com humanidade;

— A ética de filmar periferias sem exotismo, vendo gente antes de ver casos.

Fraga conta como uma equipa portuguesa — da fotografia à pós-produção — ergueu um nível técnico que nos habituamos a achar “lá de fora”, e como um elenco que junta Zé Condessa, Helena Caldeira, Rodrigo Tomás, André Leitão e Albano Jerónimo encontra o tom mais difícil: rir no meio da tragédia, chorar com pudor, errar com lógica. Há uma ideia que atravessa toda a conversa: “não há almoços grátis”. Até os presentes do mar cobram juros. E, no entanto, o episódio insiste: podemos tentar reescrever o destino — mesmo quando o destino insiste em regressar.

Ao longo desta hora, falamos de liderança no plateau, de foco (sem telemóveis, sem ruído), de como se dirige ouvindo, e do lado invisível da criação: repetir uma cena até partir, proteger actores, aceitar que a melhor ideia pode vir de qualquer lugar. Há humor, há acidez e há ternura — e há, sobretudo, uma pergunta que vale para a comunicação e para a vida: o que queremos que o público sinta? A resposta exige clareza sem demagogia, ambição internacional sem perder o chão local, e a coragem de falar para todos sem falar de cima.

Se Rabo de Peixe foi “um espelho honesto do país”, esta conversa tenta perceber como se poliu o espelho: que escolhas de linguagem, ritmo, luz e silêncio nos fazem acreditar nas pessoas que vemos no ecrã. Abrimos o episódio na costa norte de São Miguel, mas terminamos no sítio de sempre: o lugar onde a comunicação muda a forma como olhamos para os outros e, por arrasto, para nós mesmos.

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