Que lições do palco ajudam a comunicar melhor no dia a dia? Diogo Infante

Quando a comunicação deixa de ser talento e passa a ser trabalho

Diogo Infante scaled e1765906968409
VERSÃO ÁUDIO DO PODCAST
Que lições do palco ajudam a comunicar melhor no dia a dia? Diogo Infante
00:00 00:00

Há pessoas que parecem ter nascido com presença.

Quando falam, o silêncio organiza-se à volta delas. Quando entram numa sala, sentimos qualquer coisa mudar. A tentação é chamar a isso carisma. Ou talento. Ou dom.

A conversa com Diogo Infante desmonta essa ideia logo à partida.

Antes da presença houve timidez.

Antes da voz segura houve dificuldade em falar.

Antes do palco houve desajuste, deslocação, a sensação de não pertencer completamente ao sítio onde se estava.

O teatro não surgiu como ambição, mas como solução. Uma forma de aprender a comunicar quando comunicar não era natural. Um lugar onde a palavra podia ser ensaiada, onde o corpo podia ganhar confiança, onde o erro não era um fim — era parte do processo.

Talvez por isso a noção de presença apareça nesta conversa de forma tão concreta. Não como algo abstrato, mas como um estado físico e relacional. Presença é perceber se o outro está connosco. Presença é sentir quando uma frase chega — ou quando cai no vazio. E esse vazio, quando acontece, dói. Não por vaidade. Mas porque revela uma falha de ligação.

Há um momento particularmente revelador: quando fala do silêncio do público. Não o silêncio atento, mas aquele silêncio inesperado, quando uma deixa cómica não provoca riso. “Aquilo dói na alma”, diz. E nessa frase está tudo o que importa saber sobre comunicação: falar é sempre um risco. O outro não é cenário. É parte ativa do que está a acontecer.

A conversa avança e entra na exposição pública. Aqui, Diogo Infante faz uma distinção interessante: entre a pessoa privada e a figura pública. Não como máscara, mas como responsabilidade. Há um “chip” que se ativa — uma disciplina interna que permite aguentar expectativas, projeções, rótulos. A maturidade está em não confundir esse papel com a verdade interior.

É uma ideia útil num tempo em que confundimos visibilidade com autenticidade.

Falamos também de televisão, cinema, teatro. Dos ritmos diferentes. Das exigências técnicas. Mas a ideia central mantém-se: a verdade não depende do meio. Depende da intenção. Comunicar para milhões não dispensa rigor. Simplificar não é empobrecer.

Outro ponto forte da conversa é a vulnerabilidade. Num espaço público cada vez mais dominado por certezas rápidas e discursos blindados, assumir fragilidade continua a ser um gesto arriscado. Mas aqui a vulnerabilidade surge como força tranquila. Como forma de aproximação. Como autoridade que não precisa de se impor.

Quando a conversa entra no território da família, tudo ganha outra densidade. Dizer “amo-te”. Pedir desculpa. Estar disponível. A comunicação íntima aparece como o verdadeiro teste. Se falhamos aí, o resto é técnica. E só técnica não chega.

No plano mais largo, surge a pergunta maior: para que serve a arte num tempo acelerado, ruidoso, polarizado? A resposta não vem em tom grandioso. Vem simples: para nos salvar. Não salvar o mundo. Salvar-nos a nós. Da pressa. Do cinismo. Da incapacidade de escutar.

No fim, fica uma conclusão exigente:

a presença não é talento — é trabalho.

A comunicação não é performance — é relação.

E a verdade, quando existe, dá sempre algum trabalho a dizer.

Talvez seja por isso que esta conversa não é apenas sobre teatro. É sobre como falamos, como ouvimos e como estamos uns com os outros. E isso, hoje, é tudo menos simples.

LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO

Deixe um Comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

 

Voltar ao Topo