Quero reclamar.
Quero reclamar contra o ano 2022
Quero reclamar contra a guerra.
Quero reclamar contra a inflação.
Que dizem ser de 9%, mas a comida encareceu bastante mais.
Quero reclamar contra a subida dos juros.
Contra o aumento da prestação da casa.
Quero reclamar contra a apatia geral.
Contra a fúria binária dos utilizadores raivosos das redes sociais.
Contra os populismos interesseiros.
Quero reclamar contra a corrupção.
Esta reclamação parece populista.
Retiro esta reclamação
Mas continuo a ter razão.
Há tantas reclamações para fazer que só me apetece reclamar contra mim mesmo.
Reclamar porque não reclamo o suficiente.
Porque reclamo da boca para fora, mas menos com a caneta no papel.
Porque os livros de reclamação são tantas vezes não lidos por funcionários robôs que escrevem respostas-tipo.
Apesar de tudo, os portugueses tem reclamado mais.
E as marcas começaram a levar a sério a opinião dos seus clientes. Coisa que não acontecia há poucos anos. E até os reguladores formais parecem ter acordado.
Hoje os consumidores mergulham em portais de opiniões e reclamações mesmo antes de fazer a sua compra.
É uma nova forma do exercício da cidadania. Fazer valer a sua voz.
De uma forma rápida e digital.
O convidado desta edição é Pedro Lourenço que em 2009 criou o Portal da Queixa.
E hoje há mais de 2 milhões de consumidores por mês que lá passam, principalmente para procurar informação sobre produtos ou serviços que querem comprar.
Portanto, as 15 mil reclamações que lá são escritas por mês servem de base informativa para as decisões de futuros clientes.
E as melhores marcas das 10 mil citadas no portal passaram a levar a sério a voz dos clientes e as suas dores.
Porque afinal reclamar é um instinto natural.
Todos temos histórias com os nossos “bolycaos” particulares.
Normalmente o que mais nos irrita nestes episódios nem é tanto o facto de algo ter corrido mal.
Mas a sensação de que não nos ligaram nenhuma quando ensaiamos o nosso protesto.
Ou que os mecanismos de reparação são frágeis.
E isso faz com que nos sintamos todos frágeis.
Ou pior, que fiquemos com a sensação de que somos uma espécie de objetos, chamados consumidores, e que logo que a venda fique fechada já não interessamos para nada.
É o sintoma do mundo transacional. Do mundo antigo.
E eu como consumidor, cidadão, pessoa ou reclamante quero mais do que isso.
Quero ter uma relação. Que tem de gerar vantagens mútuas e não exclusivamente de compra e venda.
Qualquer bom vendedor sabe disso.
Os consumidores descobrem pouco a pouco que podem mudar o mundo.
Simplesmente falando.