Parece que nada foi encontrado no local. Talvez fazer uma pesquisa?
Parece que nada foi encontrado no local. Talvez fazer uma pesquisa?
O gesto é tudo. Ou quase tudo.
No mundo onde o silêncio quase absoluto reina é o gesto que nos liga.
Nesta edição falamos, ouvimos e gesticulamos.
Um mergulho no mundo na língua que as pessoas surdas usam para ouvir e falar. A língua gestual portuguesa.
Em cima de um palco, no cantinho da nossa televisão, numa aula na escola, numa consulta médica ou a responder num tribunal.
A vida dos intérpretes de língua gestual portuguesa é uma correria entre todos os lugares do país onde alguém que não ouve, não aprendeu falar ou até a ler e escrever, precisa de entender o mundo.
Conheci a Sofia Fernandes em cima do palco no auditório do IPO do Porto. Ela traduzia o que os vários participantes do evento diziam.
A rapidez do gesto é fascinante. Não só das mãos.
Todo o corpo participa. Gestos nos dedos, braços, ombros e a cara.
Sim, as expressões faciais estão sempre a dizer qualquer coisa.
A dizer o espanto, a dizer a alegria, a sofrer a tristeza.
Naquele palco ouvi-a depois falar de viva voz.
Da maneira como ajuda a comunidade das pessoas surdas a comunicar. A ouvir, se é que posso usar esta palavra, e a dizer o que quer. E o que ouvi não podia ficar só ali. Tinha de o partilhar convosco.
Esta conversa é sobre comunicação. Todas as conversas do Pergunta Simples são sobre comunicação. Mas esta tem um nível de complexidade difícil de entender para quem ouve. Para os ouvintes regulares do ‘podcast’.
Mas neste caso o programa não tem só áudio, ou vídeo, com legendas. Neste caso este episódio está também traduzido em lingua gestual graças à generosidade da Sofia. Pode ser visto em www.perguntasimples.com e nos YouTube desta vida.
Portanto, não só veio contar tudo o que sabe, como, no fim ainda teve de trabalhar.
Eu disse generosidade? Acrescento uma palavra: torrencial.
E eu aprendi como se diz com um só gesto a mais bela palavra do mundo
A interpretação é muito mais do que traduzir palavras. Entendi que a língua gestual portuguesa não pode ser feita palavra por palavra porque é uma língua com gramática própria e ‘nuances’ específicas. O trabalho do intérprete é captar o sentido e adaptar o que está a ser dito, principalmente em temas complexos ou pouco familiares.
Adaptar-se ao momento é essencial. Percebi que, em interpretações ao vivo, como num telejornal, o intérprete precisa de uma grande agilidade para adaptar o contexto e corrigir interpretações, quando necessário. Sofia explicou que, ao não perceber uma palavra ou perder uma parte da conversa, procura “proteger-se” e transmitir algo literal até conseguir encaixar o contexto completo.
A carga emocional nas interpretações delicadas. Nas consultas médicas ou em audiências judiciais, o intérprete é obrigado a usar a primeira pessoa, dizendo “eu”. Esta proximidade com a situação pode ser emocionalmente exigente, especialmente ao lidar com histórias de dor ou sofrimento.
A acessibilidade continua a ser uma grande barreira. A falta de intérpretes e de recursos acessíveis é evidente, e Sofia sublinhou a dependência que muitas pessoas surdas têm de amigos e conhecidos para fazer coisas simples, como ir ao médico ou tratar de assuntos burocráticos.
Conhecer o contexto é chave. Quanto mais o intérprete entende o contexto, melhor consegue interpretar com fidelidade. Por exemplo, Sofia menciona como recorre a amigos surdos para confirmar se usa os gestos mais adequados, tornando a interpretação mais rica e natural.
O impacto emocional e cultural do seu trabalho. A experiência de Sofia a interpretar um hino no estádio do Dragão revelou como momentos de grande visibilidade têm um impacto emocional e fortalecem a cultura surda. Percebi que a presença de intérpretes em momentos públicos dá poder à comunidade e fortalece a sua identidade.
A língua gestual portuguesa é uma língua própria, não uma “linguagem”. Aprendi que há uma diferença entre língua e linguagem: enquanto a linguagem gestual é mais universal, a língua gestual portuguesa é uma língua completa, com gramática e evolução cultural.
Apoiar a comunidade surda vai além do trabalho. Sofia mostrou-me que ser intérprete não é só uma profissão, é também um compromisso com a comunidade surda. Ela ajuda os seus amigos surdos no dia a dia, seja numa urgência médica, seja numa situação burocrática. Esse apoio contínuo é essencial para a inclusão.
Ainda há resistências nos serviços públicos e escolas. Sofia mencionou que enfrenta resistência ao interpretar em hospitais e escolas, pois nem todos entendem o papel do intérprete como facilitador da comunicação e, muitas vezes, veem-no como uma “ameaça”.
Dedicação e formação contínua são indispensáveis. Percebi que ser um bom intérprete não se limita à habilidade técnica; é preciso ter empatia, ser dedicado e estar disposto a evoluir constantemente. A interpretação exige o domínio da cultura surda e o compromisso de servir como ponte de comunicação.
Essas aprendizagens mostram-me o valor da interpretação na comunicação acessível e como ela é fundamental para promover uma sociedade mais inclusiva e justa.
00:00:00:00 – 00:00:11:14
JORGE CORREIA
viva. Sofia Fernandes, intérprete de Língua Gestual Portuguesa Vejo te a fazer coisas como interpretação de hinos em jogos de futebol.
00:00:11:16 – 00:00:40:03
JORGE CORREIA
Vejo te também fazer coisas como os telejornais, como as notícias que nós costumamos ver. Como é que alguém vai passando o seu dia a saltar de tema para tema, de assunto para assunto e se consegue manter, no fundo, a traduzir esta realidade daqueles que conseguem ouvir. Para aqueles que não têm essa, essa faculdade, não têm essa capacidade.
00:00:40:05 – 00:00:57:21
SOFIA FERNANDES
Então, antes de mais, obrigada pelo convite. É um prazer estar aqui. Em relação a essa questão, no fundo, eu sempre soube que isso me ia acontecer na vida, porque quando era mais jovem, comecei a ter que pensar no que queria fazer. Sempre disse que era já uma profissão que não fosse sempre a fazer a mesma coisa.
00:00:58:02 – 00:00:59:17
JORGE CORREIA
Mas esta é sempre muito diferente.
00:00:59:17 – 00:01:20:13
SOFIA FERNANDES
E isto é realmente muito diferente. Como é que se faz isso? Faz com faz com paixão, com amor à camisola, a participar muito na comunidade para também termos o máximo do léxico e gestos possíveis para podermos corresponder às diferentes situações. Mas depois ela terá de acontecer e acontece de forma natural. Exato, não sei explicar.
00:01:20:13 – 00:01:45:06
JORGE CORREIA
Assim como olha, nós que quando, por exemplo, lemos um livro, acrescentamos sempre umas palavras às nossas, às nossas bibliotecas pessoais, palavras, contextos, perceção, aprendizagem de temas. É curioso que aquilo que tu me estás a dizer é que tu também no teu trabalho, ao acompanhar e ao fazer aquilo que é uma tradução simultânea, é disso que estamos a falar, certo?
00:01:45:10 – 00:01:48:12
JORGE CORREIA
É isso que alguém que diz qualquer coisa e tu está.
00:01:48:12 – 00:01:50:13
SOFIA FERNANDES
Logo uma interpretação daquilo que está a ser dito.
00:01:50:19 – 00:02:08:01
JORGE CORREIA
Tu pareces naquele quadradinho ali da televisão aqui em baixo, quando aparecem pessoas que estão a dizer coisas. Tenho sempre uma curiosidade de saber se aquilo que tu estás a fazer em termos de gestos é literal. Tu estás a fazer palavra por palavra, estás a fazer uma interpretação de sentido. Como é que isso funciona?
00:02:08:04 – 00:02:36:23
SOFIA FERNANDES
Então? Não dá para ser palavra por palavra, porque na realidade são duas línguas dispares. A língua gestual não nasceu da língua portuguesa. A língua gestual teve a ver com uma pessoa surda que era filha de um rei. Penso não falou Hierro que era Dom João Quarto e portanto ela teve uma aprendizagem de língua gestual da parte da Suécia também, se não estou em erro, isso é, se eu sei, tenho quase a certeza que esqueci de olhar o vocabulário E a partir daí, pronto, fomos.
00:02:37:03 – 00:02:59:15
SOFIA FERNANDES
Ainda há muita história da língua gestual aqui em Portugal. Mas isto para dizer que como uma não deriva da outra, não dá para ser palavra por palavra, portanto é mesmo uma interpretação que acontece. Claro que quanto mais fidedigna ao que está a ser dito, ideal quando não é possível acompanhar em termos, lá está, a contextuais, não é o que está a ser dito.
00:02:59:20 – 00:03:14:00
SOFIA FERNANDES
Vamos fazendo uma tradução mais literal, mais ok. Está a ser dito assim, deixa me dizer. Mesmo assim, quando começamos a perceber o tema já dá para fluir mais. Já dá para a língua gestual ser mais natural, mas até se tornar natural, temos que estar dentro do contexto.
00:03:14:02 – 00:03:43:08
JORGE CORREIA
Olha, quando estamos a falar de coisas comuns, como são as notícias ou quando tu conheces o contexto exacto em que estás a trabalhar, imagino que consigas preparar te de uma forma claro, mais fáceis. Como é que tu funciona quando te calha na rifa teres que traduzir um tema ou muito difícil, ou que tu não dominas, ou que no meio daquela conversa tu perdeste uma palavra ou uma expressão que era críptica para perceber o resto do contexto que.
00:03:43:10 – 00:04:06:21
SOFIA FERNANDES
Essa quinta essência acontece sem o que o que nós fazemos é lá estar com uma tradução simultânea e segue porque ninguém para para nós conseguirmos corrigir, nem aquilo que nós fazemos e à frente apanhamos o contexto e dependendo podemos dizer que houve falha, não é? Foi uma falha nossa. Por exemplo, numa palestra com as pessoas surdas à frente, dá para dizer olha, falhava o Era isto que eu queria ter dito.
00:04:06:21 – 00:04:07:04
SOFIA FERNANDES
Não é que.
00:04:07:06 – 00:04:07:14
JORGE CORREIA
Faça uma.
00:04:07:14 – 00:04:27:03
SOFIA FERNANDES
Correção, exatamente uma correção sobre o que acabou de ser dito, mas regra geral, nós vamos protegendo nos e, portanto, se não temos certeza do contexto que é, não é, vamos fazê la. Está literal. Ela está a uma palavra que não tenha gesto, ou que nós não nos lembremos do gesto, ou que não estejamos dentro do contexto. Dizemos com uma palavra e através do abecedário e depois à frente.
00:04:27:03 – 00:04:50:15
SOFIA FERNANDES
Se a palavra fizer significado para nós, então aí já fazemos o gesto, se o soubermos, ou então já há uma ideia do que é o gesto. Lá está, eu tinha dado um exemplo relativo a um programa que que eu fiz, que é da área da saúde e que às tantas é dito válvulas e na altura válvula. Estávamos a falar do coração, Válvulas não estava a fazer sentido absolutamente nenhum para mim, muito embora agora pensando, faz todo o sentido.
00:04:50:20 – 00:05:11:13
SOFIA FERNANDES
Mas na altura não estava a fazer sentido para mim por alguma razão. Exatamente. E entretanto percebi que lá está quem são as portas do coração que abre e fecha para que o sangue passe. Às tantas já estava a dizer Portas, mas até eu dizer portas para fazer sentido em língua gestual e eu tive que dizer várias vezes, vi a e portanto, toda palavra de válvulas.
00:05:11:13 – 00:05:30:22
SOFIA FERNANDES
Isto pronto, é isto. Pois é com a prática nós. Mas temos que nos proteger na medida em não considerarmos que estamos dentro do contexto. Se não tivermos, portanto, se não tiver a certeza do que estou a dizer, se eu não tiver a certeza do contexto em que tenho, tenho que dizer a palavra literal e fazer ao máximo a proteção de passar o que está a ser dito.
00:05:31:02 – 00:05:52:22
SOFIA FERNANDES
Mas com cuidado para não haver depois uma má interpretação da minha parte. Isso acontece nas músicas. Por exemplo, o Rui Veloso tem a parte de primavera da vida, é bonita de viver e eu agora já já estudei várias vezes a música. Eu sei que a primavera da vida é a adolescência, mas eu posso dizer a primavera da vida pode ser primavera e a sua vida, porque é a primavera da vida, não é?
00:05:52:24 – 00:05:58:21
SOFIA FERNANDES
Ou posso dizer logo adolescência depende. Quando dentro do contexto eu estou. Quanto à certeza que eu tenho daquilo que está a ser dito.
00:05:58:21 – 00:06:06:14
JORGE CORREIA
Então quer dizer que tu poderás trabalhar. Tu também podes escolher um tempo e um modo para tornar a tua interpretação mais pura.
00:06:06:14 – 00:06:26:01
SOFIA FERNANDES
Mais rica, O ideal isto é comum, como também ler ler tem o seu, tem a sua riqueza. Se nos derem um texto na primeira nós vamos ler de forma totalmente diferente. Se nos derem um texto a décima vez, não é? Se nós tivermos tempo de preparar, preparamos as vírgulas, as pausas. Como é que vamos dizer as perguntas? Com que entoação é que vamos dar?
00:06:26:03 – 00:06:42:18
SOFIA FERNANDES
A língua gestual é exactamente igual Se eu tiver o guião antes, a minha língua gestual é muito mais bonita, inclusive em algumas situações. Para ficar ainda mais rica, eu falo com os meus amigos surdos, que felizmente tenho alguns na minha vida mesmo. Mesmo aquelas amizades que dá para ligar a qualquer hora. Olha, eu vou entrar não sei quê.
00:06:42:20 – 00:07:02:13
SOFIA FERNANDES
Eu tenho dúvida que num gesto ligeiro não sei quem percorre ou o que eu sei que essa palavra vai ser dita. E eles dizem me logo já isto é, nessa questão de embelezar, quando tenho tempo de preparar, surge uma que uma frase eu estou a pensar fazer assim como é que tu farias? E eles como? Pronto, diariamente, desde que nasceram, fazem língua gestual.
00:07:02:19 – 00:07:23:02
SOFIA FERNANDES
A língua gestual deles é muito mais bonita do que a minha, embora a minha não me seja bonita. Então porque? Porque é diferente. Por exemplo, nós podemos fazer olhar à volta, por exemplo. Ai ele ficou mesmo a olhar à volta de um banco, a olhar e eu, por exemplo, posso fazer o olhar à volta, mas eles tiram os olhos e fazem assim.
00:07:23:04 – 00:07:43:01
SOFIA FERNANDES
É muito mais bonito. Eu não sei explicar. Eu dei agora este exemplo, foi o que me lembrei. Foi mais recente, mas é mais rica, é mais visual. A minha não é tão visual, a minha é mais literária, lá está. Agora já estou dentro da comunidade. Há muitos anos. Vai sendo cada vez mais bonita, mas a língua gestual é muito rica e as pessoas surdas têm uma língua gestual muito bonita.
00:07:43:01 – 00:07:57:22
SOFIA FERNANDES
Não é comum um ouvinte chegar passado 20 anos de já ter nascido, nunca ter contactado com a língua. De repente faço língua gestual. Claro que a minha língua gestual não vai ser tão rica, não é? E é isso. Se me derem um texto e tiver tempo de preparar, ele vai ser muito mais bonito do que se eu não tiver tempo de preparar.
00:07:57:24 – 00:08:19:01
JORGE CORREIA
Olha, deixa me fazer uma nota que neste contexto é francamente relevante, que é este episódio. Todos os episódios, mas este em particular, não só está a ser gravado em áudio. Pode ser ouvido no carro. Normalmente é quando as pessoas ouvem ou nos bastidores, mas também está a ser levado em vídeo. E agora com as tecnologias é possível vermos as legendas.
00:08:19:01 – 00:08:34:23
JORGE CORREIA
Portanto, quem for desta comunidade ou tiver amigos da comunidade, das pessoas que não consigam ouvir, tem esta para ser verdade também para ouvir qual é o mais bonito gesto que existe para mim.
00:08:35:00 – 00:08:57:16
SOFIA FERNANDES
Eu gosto muito dos gestos, um bocado aleatório, já eu gosto muito do gesto mundoque é assim o gesto do mundo. Não sei porque, mas eu gosto e gosto muito do gesto, desenvolvimento, desenvolvimento e envolvimento. Começa assim e depois faz o desenvolvimento e o gesto. O mundo. Não sei porquê, mas são dois gestos que eu acho bonitos. Arquipélago também é giro.
00:08:57:18 – 00:08:58:15
SOFIA FERNANDES
Sim.
00:08:58:17 – 00:09:03:21
JORGE CORREIA
É curioso que tu estás a fazer, estás a fazer o gesto do mundo e seu mundo.
00:09:03:21 – 00:09:24:01
SOFIA FERNANDES
É isto tudo, é recolher, é muito giro, é o primeiro gesto que eu aprendi. Também tenho uma ligação emocional a ele, que é o outono, portanto, isto é a árvore, a folha a cair. E foi este gesto que me fez ficar na língua gestual, porque a partir do momento em que eu percebi que era tão lógico, fiquei agarrada.
00:09:24:03 – 00:09:37:13
SOFIA FERNANDES
Foi mesmo o primeiro gesto que eu aprendi. Foi como com o professor Ângelo. Gosto muito, muito dele, tenho muito carinho por ele. E pronto, ele lá às tantas estava para as estações do ano e o primeiro gesto que eu aprendi foi Outono. Que é que é a árvore? É a folha a cair?
00:09:37:19 – 00:09:42:09
JORGE CORREIA
O que é que o professor Ângelo? O que que o mestre Ângelo tem ensinou?
00:09:42:11 – 00:10:10:19
SOFIA FERNANDES
Ensinou me. Nós tínhamos, tínhamos as aulas teóricas e tínhamos as aulas práticas. Não havia aula prática, era mesmo de língua gestual. Portanto, todas as aulas eram um tema. Todos os dias ele dava gestos para que nós ficássemos o mais ricas possíveis e tivéssemos os temas mais versáteis possíveis para quando começarmos a entrar na vida das pessoas surdas, seja em estágios, seja para a vida profissional, começamos a dar resposta o máximo possível, com um máximo vocabulário, com gestos.
00:10:10:19 – 00:10:25:05
SOFIA FERNANDES
Não é possível se não tivermos esses gestos, vamos estar sempre a fazer a teologia, que é o AVC, o AVC, como eu dizia há bocado em válvulas, não tendo o gesto, depois não consigo transmitir e portanto deu me o léxico todo que tenho associado à língua gestual.
00:10:25:06 – 00:10:41:11
JORGE CORREIA
Já que tu estás a falar das palavras. É curioso, tu falaste das das válvulas e eu estava a ouvir a primeira vez e a pensar válvulas de processo de coração. Eu Ah, não são válvulas de água. Depois pensei também a restauração não é a restauração para restaurar um quadro, uma obra de arte ou.
00:10:41:11 – 00:11:07:18
SOFIA FERNANDES
Restauração é comer. Exatamente por isso é que é tão importante estar dentro do contexto. E se não estiver nos protegermos na medida até ficarmos dentro do contexto, até podermos afirmar que é isso o resto. Porque senão às tantas estamos a falar de acontecer Uma coisa muito interessante Quando eu estava a estudar a minha licenciatura, aconteceu uma coisa muito interessante que era e eu interpretei a primeira vez, o primeiro texto em que eu ouvi uma pessoa surda a fazer e eu tive que dar a voz.
00:11:07:20 – 00:11:39:12
SOFIA FERNANDES
Ok, era um texto sobre tradução ao contrário, não era eu ouvir e passar. Para já estarei a ouvir e passar para vós. E foi o meu primeiro texto e aquilo saiu totalmente ao lado. Porquê? Porque o contexto era professor e eu de alguma forma entendi música. Então, quando eles diziam sala de aula e eu dizia orquestra tanto, todos juntos, orquestra, porque eu estava na música e a minha professora foi o que ela disse Tu tens tanta criatividade quanto conseguir dizer porque é assim, Às tantas tu mantiveste o contexto todo e tu não estás errada quando dizes algumas coisas.
00:11:39:12 – 00:11:53:04
SOFIA FERNANDES
Elas fizeram sentido. Tudo. Alguma forma. Conseguiste unir os dois temas, mas efetivamente, eu estava totalmente na história. Estava noutra rua paralela, estávamos em paralelo, nunca nos encontramos e eu achei também espetacular a minha capacidade de criatividade.
00:11:53:04 – 00:11:54:21
JORGE CORREIA
Portanto, estavas literalmente perdida.
00:11:54:21 – 00:12:04:06
SOFIA FERNANDES
No contexto, não é? Não me foi dado. Era um texto, não podia ser dado o contexto. Eu tinha que entrar e dizer e falar sobre o que estava a ser dito. E eu assumi que era música.
00:12:04:08 – 00:12:04:17
JORGE CORREIA
E qual.
00:12:04:17 – 00:12:05:08
SOFIA FERNANDES
É.
00:12:05:10 – 00:12:08:08
JORGE CORREIA
E qual é a palavra impossível de se dizer?
00:12:08:10 – 00:12:10:23
SOFIA FERNANDES
Qual é a palavra impossível? Como é que é o gesto impossível?
00:12:10:23 – 00:12:19:20
JORGE CORREIA
Ou então as palavras impossíveis. Tu tens sempre esse recurso, lá está, a poder dizer as letras. Há palavras impossíveis.
00:12:20:00 – 00:12:27:12
SOFIA FERNANDES
Não há palavras impossíveis de dizer se forem ditas. Nós somos intérpretes. Sou. O locutor decidiu dizer. Se a pessoa decidiu dizer. Nós também dizemos.
00:12:27:14 – 00:12:29:17
JORGE CORREIA
Isso não faz aquilo que não foi.
00:12:29:19 – 00:12:45:10
SOFIA FERNANDES
Não, não, não podemos dizer nós, nós dizemos nós temos que ser o máximo fiéis ao discurso. Portanto, se a pessoa optou por dizer, por cantar, por representar, nós temos que interpretar também, porque não foi uma. Não podemos cortar ao discurso da pessoa, não é?
00:12:45:12 – 00:13:08:17
JORGE CORREIA
Olha, deixa me entrar no teu cérebro e tu acabas de me dizer que primeiro tens a questão do contexto. Depois isto acontece muitas vezes, em muitas vezes em tempo real. Por exemplo, num telejornal, uma peça de teatro, o que for, é ao mesmo tempo tu dizes me que também estás a aprender com pessoas que são, que são surdas, mas que de que conhecem daquele contexto.
00:13:08:19 – 00:13:18:15
JORGE CORREIA
Como é que tu consegues organizar o teu cérebro estando a interpretar ou ouvir e ao mesmo tempo, nesse processo de aprendizagem contínua dessa comunicação?
00:13:18:17 – 00:13:38:12
SOFIA FERNANDES
E não sei se é por ser mulher, mas às vezes ainda consigo pensar se a roupa está ou não lavada, porque eu juro que isto é mesmo verdade. Uma vez estava num teatro, estava a interpretar e de alguma forma, no meio da minha intervenção, consegui pensar será que eu estou no X que me mandaram? Porque eu lembro me que tens que ficar no X, que às tantas olhe para o chão dizendo estou no X ou não?
00:13:38:14 – 00:13:49:21
SOFIA FERNANDES
E eu pensei E depois comecei a pensar como é que eu estou a pensar enquanto estou a interpretar? E eu? Depois aquilo ficou gravado, fui ver e eu estava a interpretar. Eu estava a dizer o que estava, porque eu não sei como é que isto se faz.
00:13:49:23 – 00:13:51:16
JORGE CORREIA
E lá dentro tudo aquilo que eu comento.
00:13:51:16 – 00:14:06:19
SOFIA FERNANDES
É que mesmo até que continua a não funcionar alguma forma. Porque sim, eu estava e eu estava a pensar numa coisa e estava a reproduzir outra porque estava a ouvir outra. E foi uma. Uma salada. Como é que se faz? Com bastante prática. Uma das coisas que eu costumo fazer e que gosto muito de fazer e não me foi ensinada foi.
00:14:06:20 – 00:14:11:03
SOFIA FERNANDES
Eu desde sempre fiquei apaixonada pela língua gestual e acho que se nota quando, quando ou quando fala.
00:14:11:04 – 00:14:12:13
JORGE CORREIA
Não foi o clique.
00:14:12:15 – 00:14:32:23
SOFIA FERNANDES
O clique foi o outono, o clique foi o gesto. Outono e eu na primeira aula, no primeiro gesto, fiquei completamente agarrada. Eu nunca fui uma aluna exemplar e na faculdade fui e no mestrado fui aluna de mérito porque é a minha paixão. Eu costumo dizer que a minha profissão me escolheu e eu sou completamente apaixonada por aquilo que faço.
00:14:32:23 – 00:14:35:03
SOFIA FERNANDES
Eu acho que é nato.
00:14:35:03 – 00:14:40:16
JORGE CORREIA
Depois também olha o que te dizem os teus amigos surdos.
00:14:40:18 – 00:14:41:12
SOFIA FERNANDES
Em que sentido?
00:14:41:13 – 00:14:51:11
JORGE CORREIA
Aquilo que tu quiseres eu deixo esta pergunta em aberto. Porque? Porque não me interessa especialmente saber como é que eles pensam que tu és tecnicamente. Mas como é que? Como é que eles se relacionam contigo?
00:14:51:16 – 00:15:13:06
SOFIA FERNANDES
Os meus amigos surdos começaram a ser os meus amigos porque em algum momento nos encontramos de forma profissional. Sempre. Não é porque eu não entrei na comunidade, porque tem alguém surdo e eu entrei na comunidade porque fiz uma licenciatura e, portanto foi porque em algum momento na nossa profissão nos encontramos e porque as nossas línguas gestuais casaram e consideraram que eu era uma boa profissional.
00:15:13:06 – 00:15:28:20
SOFIA FERNANDES
Mas depois parto para amizade. É muito simples, porque se eu estou durante um ano a interpretar a luz para uma pessoa surda, que tem quase a minha idade, é normal depois nascer uma relação de amizade. O que é que eles dizem sobre mim? Eles podem contar comigo para tudo, porque diariamente a língua gestual, mesmo que até nem seja a trabalhar.
00:15:28:20 – 00:15:42:16
SOFIA FERNANDES
Há dias que eu estou de folga. Não e não tenho nenhum trabalho, mas tenho uma pessoa surda a ligar me. Olha aqui em Guimarães, na autoestrada, por favor, preciso que me ligue porque o meu carro avariou e eu não sei como é que eu vou fazer isto. E Ok, então espera aí, onde é que estás? Onde é que estás a ver?
00:15:42:16 – 00:15:57:20
SOFIA FERNANDES
Estás na nacional? Não sei quê estás? Não sei que mais. Lá vou eu. Sim, é uma pessoa surda. Não sei o que isto é. É muito rápido. Olha, se eu estou aqui na Segurança Social, não estou mesmo conseguir comunicar. Por favor, diz me. Às tantas viram o telemóvel para eles não é o alvo. A pessoa da Segurança Social apresenta lá seus fios.
00:15:57:20 – 00:16:19:09
SOFIA FERNANDES
Sou inteiro tal, isto acontece isto na minha vida e o meu noivo sabe que é muito regular. Portanto ele está habituado a que eu qualquer momento ele olha para aí, toma, ligar pode ser urgente e atendo e diz diz Ah, olha tu aqui na segurança social, pá, não tou mesmo a conseguir fazer isto, não estamos a entender através da escrita, pá, preciso da tua ajuda.
00:16:19:11 – 00:16:23:09
SOFIA FERNANDES
E portanto, com os amigos dizem sobre mim, amigos, amigos. Sei que podem contar comigo sempre.
00:16:23:10 – 00:16:29:23
JORGE CORREIA
O que é uma coisa sempre boa lá estar, ter, ter alguém a quem nós podemos ligar.
00:16:30:00 – 00:16:47:12
SOFIA FERNANDES
É triste por não ter, triste por terem que ter isso. Portanto é muito triste nós enquanto sociedade, não oferecermos esse recurso de forma natural. É muito triste a pessoa surda ter que ter alguém que tem um amigo, um familiar para acompanhar o porque é que não podem ir ao teatro quando lhes apetece, o porque é que têm que se certificar que naquele teatro vai haver intérprete?
00:16:47:14 – 00:17:03:04
SOFIA FERNANDES
Porque eu e o Jorge, se quisermos ir ao teatro, vamos eles, não eles vão lá fazer o quê? Tem que levar. Eles não têm essa liberdade. Não é um levar alguém, porque até nem deve ser permitido. A pessoa de repente se parecer importar e mesmo certificar se aquele teatro vai ter interdito ou não. Não é? E a.
00:17:03:04 – 00:17:04:04
JORGE CORREIA
Maioria das vezes não tem.
00:17:04:04 – 00:17:17:16
SOFIA FERNANDES
Não tem, quero E eu estou a falar de uma coisa artística, Portanto, depois há as coisas mais complicadas, não é a área da saúde. Eu vou a uma urgência a qualquer hora e eu pode me acontecer qualquer coisa ou aos meus filhos ou não, Mas, mas pode acontecer.
00:17:17:16 – 00:17:19:03
JORGE CORREIA
Nós temos esse recurso de poder.
00:17:19:06 – 00:17:32:13
SOFIA FERNANDES
Nós vamos, nós vamos aí já está. Nós nem sequer pensamos que vamos chegar lá e não vamos ser entendidos. Eles estão sempre com essa preocupação. Será que eu vou chegar lá e vou ser entendido? E nós contamos Mais nervosos conseguimos comunicar ainda pior. Não é que vamos, não vamos encontrar uma coisa.
00:17:32:17 – 00:17:33:00
JORGE CORREIA
E depois não.
00:17:33:00 – 00:17:46:10
SOFIA FERNANDES
Perceber o que eu vou fazer. Como dizer É de repente. Agora imaginemos se ainda tivermos atenuantes, de não termos a nossa língua mãe como referência. Ter que ser uma língua segunda é a mesma coisa que eu chegar a um hospital na China. Como é que eu vou fazer se acontecer uma coisa na China?
00:17:46:11 – 00:17:48:04
JORGE CORREIA
Porque as pessoas não se entendem? Porque há pessoas.
00:17:48:04 – 00:17:53:05
SOFIA FERNANDES
Que não entendem? Eu não entendo as pessoas. É exactamente igual com as pessoas surdas que recorrem à língua gestual para poder comunicar.
00:17:53:05 – 00:17:54:19
JORGE CORREIA
Tu acompanhas doentes?
00:17:54:21 – 00:17:57:21
SOFIA FERNANDES
Sim, sim. Eu faço interpretações de consultas médicas. Sim.
00:17:58:01 – 00:18:03:22
JORGE CORREIA
Olha, sem querer violar a privacidade de ninguém, obviamente. Das últimas vezes que acompanhaste.
00:18:03:24 – 00:18:25:12
SOFIA FERNANDES
Sim, tem aquela história muito bonita que foi Olha, foi muito engraçado, porque eu fui acompanhar uma pessoa que era surda, de baixa visão, portanto tinha essa necessidade toda extra. E na altura eu até disse olha, eu nunca tive, nunca interpretei para uma pessoa surda de baixa visão. Portanto, se conseguires arranjar alguém que estejas habituado a levar, não é porque estou assustado, pois é um casamento entre gestos e entre relações.
00:18:25:14 – 00:18:42:06
SOFIA FERNANDES
Eu prefiro colegas a essa pessoa até à última da hora a pessoa não conseguiu. Eu já tinha reservado na minha agenda para essa pessoa, Não consegui isso, então decidi ir com muito bem. Foi uma esperança que eu gostei imenso. A pessoa também gostou muito dos meus gestos e da forma como eu já estou. Dizem que era muito calma para para perceção e tudo perante a pessoa.
00:18:42:06 – 00:18:59:05
SOFIA FERNANDES
Era surtando para te avisar o tempo, como agarrar nas mãos para conseguir compreender. Não é porque não posso ficar a olhar para mim enquanto eu interpreto por, portanto, não consegue ver exatamente, Portanto, agarra me nas mãos enquanto eu estou a interpretar tento. Quanto mais suave eu for nos gestos, melhor. Portanto, é ali agarrando nas mãos e depois soltava as minhas mãos para falar e eu estava ali.
00:18:59:05 – 00:19:18:21
SOFIA FERNANDES
Voz não é? Mas isto para dizer o quê? Depois essa pessoa comum era surda, de baixa visão. Tinha uma assistente que ia com ele para o guiar no caminho. E olha, aqui tem escadas. Olha aqui para aqui. É um trabalho que nós não estamos habituados a fazerem quando nós vamos lá para fazer uma interpretação e portanto, a assistente pessoal também veio.
00:19:19:02 – 00:19:36:17
SOFIA FERNANDES
E depois ela contou me uma coisa muito gira que às tantas parece que houve o movimento todo que foi que foi pedido em namoro por minha causa, ou seja, que o namorado dela não é e tinha me enviado há um ano atrás uma mensagem a perguntar como é que se dizia ti, como é que se dizia quero namorar contigo.
00:19:36:18 – 00:19:37:12
JORGE CORREIA
Já agora, como é que se diz?
00:19:37:12 – 00:20:02:22
SOFIA FERNANDES
Gosto, Gosto de ti e quer namorar comigo? E eu na altura própria enviei lhe um vídeo com calma, mais calma, para lhe explicar como é que se fazia e ele lá lhe pediu em namoro e as coisas resultaram. Eu fiquei muito contente. Eu sou a pessoa que fui, pediu em namoro e disse será Que engraçado? E às tantas fiquei muito feliz, não só por ter resultado bem para para a pessoa surda, cega que acompanhei, mas também por ter resultado em namoro daquela que eu não tinha nada a ver com isso.
00:20:02:24 – 00:20:22:05
SOFIA FERNANDES
Mas fiquei muito contente porque, lá está, às vezes são às vezes estas coisas de ser. A ponte de ligação não influencia só um lado na pessoa, também começa a propagar mesmo, até nas minhas redes sociais, não é? Tem muitas pessoas que depois me conta como é que eu posso aprender, pode me ensinar e envio sempre as associações de surdos.
00:20:22:05 – 00:20:28:08
SOFIA FERNANDES
Envio sempre às pessoas que fazem isso de forma individual, que é para as pessoas conseguirem aprender o que tanto querem.
00:20:28:10 – 00:20:42:24
JORGE CORREIA
Olha, vamos, Vamos para essa consulta, que é sempre partimos do início, quando nós vamos a uma consulta médica, vamos lá para nos queixarmos de alguma coisa. Como é que isto é? Que essa descrição dos sintomas.
00:20:43:01 – 00:21:02:12
SOFIA FERNANDES
É exatamente igual? Portanto, quanto mais stress, quanto mais aparecer que a interpretação vai, o melhor. Portanto, a pessoa senta se ou o médico está em frente. Não é o tradicional, o médico fala e eu interpreto para a pessoa, a pessoa fala, eu interpreto para o médico. Portanto, quanto mais alto tecido e quanto mais fora eu estiver, melhor é sinal que está a fluir.
00:21:02:12 – 00:21:17:09
SOFIA FERNANDES
A conversa por cá, às tantas, quando se está a falar com uma pessoa surda, não se fala na terceira pessoa, não se diz, diz lhe que não é direito. Como é que te sentes? Sentes o que está aqui, ali e a pessoa não responde Olha, eu quero dizer que ou eu não digo, a pessoa está a dizer que lhe dói.
00:21:17:09 – 00:21:32:14
SOFIA FERNANDES
Não, eu digo dói me dói. Mali, vai, mali. Às tantas, por exemplo, em tribunal, por exemplo, acaba por ser bastante difícil. Porque eu tenho que dizer na primeira pessoa o que está a acontecer. Eu tenho que dizer aconteceu me isto, Fui vítima disto.
00:21:32:14 – 00:21:33:13
JORGE CORREIA
Não é estranho para ti?
00:21:33:18 – 00:21:53:09
SOFIA FERNANDES
Foi muito estranho. A primeira vez que foi um tribunal foi muito estranho. Nessa. Nessa medida, foi muito estranho eu ter dito que fui eu o culpado ou aconteceu me isto? Já fui a várias. Então às tantas não dizia fui eu, fui eu que fiz isto, Sou eu que sou culpada. Às tantas, noutro dia sou eu a vítima disto é o eu.
00:21:53:11 – 00:22:04:22
SOFIA FERNANDES
Dói. Dói por a pessoa que acompanha. Não é porque sou extremamente sensível e dói me a mim, porque é o eu sou eu sem ser eu. É um distanciamento mais difícil de se fazer.
00:22:05:02 – 00:22:11:17
JORGE CORREIA
É, no fundo, dizer, fazer uma tradução de sim, eu matei.
00:22:11:19 – 00:22:12:09
SOFIA FERNANDES
Posso dizer.
00:22:12:11 – 00:22:13:23
JORGE CORREIA
Isso? Sim, eu fui violada.
00:22:13:23 – 00:22:37:13
SOFIA FERNANDES
Exatamente isso, Exatamente isso. Não. Só que tenho que conseguir profissionalmente, de forma mental, distanciar me do eu não sou eu, mas sou eu. Tenho que dar na primeira pessoa. A pessoa está a dizer eu não posso dizer a pessoa X está a dizer que matou a pessoa X está a dizer que foi violada? Não, Eu tenho que dizer eu fui violada na rua, não sei o que aconteceu me.
00:22:37:13 – 00:22:41:22
SOFIA FERNANDES
Isto é que é isto. Dói a cada palavra que é dita. Dói porque.
00:22:41:22 – 00:22:47:09
JORGE CORREIA
Tu estás a interpretar no fundo, o sentido daquela palavra e no fundo, aquela dor.
00:22:47:09 – 00:22:57:04
SOFIA FERNANDES
Na primeira pessoa, na primeira pessoa. Por isso é que eu digo nós quanto mais pudermos desaparecer, melhor estamos a fazer o nosso trabalho.
00:22:57:06 – 00:23:06:07
JORGE CORREIA
Tu funções quase como uma atriz que que está num palco a replicar aquilo que estás a ver de alguém que não consegue falar exatamente.
00:23:06:09 – 00:23:12:18
SOFIA FERNANDES
Nós, quando estamos num palco, por exemplo, quando o interpretei, se estivesse feliz a dizer alguma coisa, eu estava feliz também a dizer.
00:23:12:18 – 00:23:29:02
JORGE CORREIA
Já agora, temos que contar as pessoas que falam quantas pessoas não sabem? Nós encontramos há um par de semanas, não num evento sobre comunicação no um, no auditório do Instituto de Oncologia do Porto, e eu estava descansadinho da vida falando a 1000 à hora. Desculpa.
00:23:29:05 – 00:23:30:03
SOFIA FERNANDES
Não, não, sem problema.
00:23:30:03 – 00:23:54:13
JORGE CORREIA
Também deve ter sido um sossego. Porque pela pela, pela porta, pelo metralhar das palavras, nós nunca pensamos nisso, Não é que é isso que se calhar há pessoas que não estão a acompanhar o ritmo? Se calhar estás tu ali. E depois foi uma grata surpresa ver que tu te levantaste e eu disse Olha, esta pessoa também agora vai contar a sua experiência e vai partilhar aqui como é que é a sua.
00:23:54:15 – 00:23:58:02
JORGE CORREIA
Como é que é a sua vida? Como é que faz estas? Como é que faz estas.
00:23:58:08 – 00:23:59:22
SOFIA FERNANDES
Receber a comunicação ali?
00:23:59:22 – 00:24:02:07
JORGE CORREIA
Qual é levar se uma pessoa para o palco?
00:24:02:09 – 00:24:20:19
SOFIA FERNANDES
Sim, porque eu considero que quando é para ensinar, não devo ser eu a ensinar. Eu não sou formador, eu sou intérprete e eu não ensino a minha base. Não é o ensino, portanto é eu. Sempre que em algum momento me pedem para eu ensinar, até às vezes pedem mesmo assim olha, pode me dar alguma formação ou das formações e eu dou sempre os contactos de quem dá formações.
00:24:21:00 – 00:24:43:03
SOFIA FERNANDES
Eu não sou formador, não queres? Não, não acho que seja o meu lugar. Tou mesmo satisfeito com a profissão que desempenho. Eu sinto que quando tiver que haver lugar, se houver espaço na minha vida para ver, eu hei de encontraria sítio. Mas para já não sinto que seja. Aí eu sinto que o meu dia a dia é como o dia a dia das pessoas, não é fechada a ensinar, não me identifica ainda nesse contexto é.
00:24:43:03 – 00:24:43:16
JORGE CORREIA
Estar a treinar.
00:24:43:17 – 00:24:44:24
SOFIA FERNANDES
Não acho que seja o meu lugar.
00:24:45:00 – 00:25:00:14
JORGE CORREIA
Olha, tu tens uma visão privilegiada, tens uma audição privilegiada, de facto, da comunidade de surdos dos surdos em Portugal. O que eles sentem nesta altura? Como é que? Como é que eles vêem esse cidade e a maneira como a sociedade os trata?
00:25:00:16 – 00:25:30:01
SOFIA FERNANDES
Lá está, normalmente essa pergunta e eu adoro trazer alguém para estar comigo e falar, Mas eu respondo tudo às pessoas pelas pessoas surdas que estão mais em contacto comigo. Não são. Não são pessoas tristes que não saibam viver a vida deles. Tenho vidas totalmente normais. São pais, são mães, têm profissões das mais diversificadas. E ainda agora tive num almoço com uma amiga minha que tem uma empresa que é a área junto a ela que faz as joias espetacular que a empreendedora faz.
00:25:30:01 – 00:25:47:24
SOFIA FERNANDES
A vida dela, portanto, tem vidas socialmente normais em termos de sociedade e que obviamente sentem que a sociedade nos falha. Ela está por causa do que falamos há bocadinho, não é vão a qualquer sítio, não têm nenhuma intérprete disponível. Isso não é justo, porque nós vamos a qualquer sítio, Temos sempre a possibilidade de comunicação e nesse aspeto, obviamente que a sociedade falha.
00:25:47:24 – 00:26:03:18
SOFIA FERNANDES
Claro que eles têm um recurso. Neste caso, que sou eu, Não ligo diretamente para mim. Dizem se eu preciso da tua ajuda, mas quando não posso atender, por exemplo, eu estou na aldeia da minha avó, por exemplo. Fui fazer uma visita, não tenho tempo absolutamente nenhuma e agora que o telemóvel está em modo avião, se algum deles não tiver a ligar, eu não estou disponível, mãe.
00:26:03:20 – 00:26:12:20
SOFIA FERNANDES
E portanto, quando não estou disponível eles ficam mesmo ali, sozinha. Claro, podem tentar outra pessoa. Como é óbvio, eu não sou o único recurso deles, mas lá está, não deviam de ter que ter recurso.
00:26:12:21 – 00:26:13:08
JORGE CORREIA
Isto pode.
00:26:13:09 – 00:26:15:11
SOFIA FERNANDES
Acontecer.
00:26:15:13 – 00:26:19:15
JORGE CORREIA
Dado isto complica se quando estamos a falar sempre de uma emergência médica.
00:26:19:18 – 00:26:20:06
SOFIA FERNANDES
Exacto.
00:26:20:08 – 00:26:22:00
JORGE CORREIA
Eram 112 exatamente.
00:26:22:01 – 00:26:49:03
SOFIA FERNANDES
E que eu fiz parte até, inclusive do primeiro projeto piloto de 112, que era para urgências de pessoas como nós. Quando ligamos para 112, mais pessoas surdas ligavam e havia uma videochamada que era realizada. Infelizmente, passado um ano foi um ano. Um ano e meio já não foi fechado, já não ia se esse projeto do 112 ao do SNS 24 Portanto, sobre algum sintoma que a pessoa esteja a sentir durante 24 horas tem essa possibilidade de desligar.
00:26:49:05 – 00:27:08:12
SOFIA FERNANDES
Se for ao médico e entrar no médico, depende se o médico aceita ou não, porque o intérprete é muitas vezes visto como um invasor. A primeira vez que eu trabalhei, trabalhei como intérprete escola. Nesse ano, no final do ano, decidi que não trabalhava mais. Eu explico porquê. É que o meu coração parece assim muito forte, mas depois eu sou muito manteiga.
00:27:08:14 – 00:27:11:12
SOFIA FERNANDES
Mas quando eu trabalhei a primeira vez foi em de escolar.
00:27:11:12 – 00:27:13:09
JORGE CORREIA
O que era difícil.
00:27:13:11 – 00:27:21:10
SOFIA FERNANDES
E logo na primeira aula em que eu tive que entrar, o professor sentiu que eu era um extra na sala.
00:27:21:12 – 00:27:22:21
JORGE CORREIA
O elemento perturbador.
00:27:22:23 – 00:27:36:23
SOFIA FERNANDES
Não é precisar aqui. É, eu disse, mas é aqui que está o aluno X. Sim, sim, mas não é necessário. Então eu voltei até o diretor e disse Olhe, peço desculpa, no meu horário tem esta sala, é mesmo esta sala que eu tenho de ir? Sim, sim, porque o professor X disse me que não, Então eu vou lá consigo.
00:27:36:23 – 00:27:55:17
SOFIA FERNANDES
Ok, chegou lá comigo e eu entrei, portanto não estudo, pois parece um choque muito grande. Mas depois, no final de um ano, quando se começa a perceber o papel de intérprete, que não é tirar o papel de qualquer outra pessoa, começa se a deixar o intérprete estar, porque no fundo estamos a fazer a ponte, não é Enquanto não é percebido que nós somos apenas uma ponte.
00:27:55:17 – 00:28:03:10
SOFIA FERNANDES
Nós somos mesmo uma ameaça, como se fôssemos ver se algo está a correr bem, como somos mesmo vistos como alguém.
00:28:03:12 – 00:28:04:02
JORGE CORREIA
Uma espia.
00:28:04:03 – 00:28:30:10
SOFIA FERNANDES
Exato. E portanto, nem sempre somos bem recebidos e, portanto, também há médicos que, por essa razão, também não permitem que haja, por exemplo, uma videochamada. E não, não querem que haja uma videochamada, não querem que haja um interpretar, entrar, não querem que a sua consulta seja vista por outra pessoa, querem ver o doente e já está. E, portanto, o CNS 24 é um recurso que as pessoas podem ter se forem a um hospital e ligarem para lá.
00:28:30:10 – 00:28:45:18
SOFIA FERNANDES
E olha, eu estou agora no hospital, preciso de um intérprete, Mas se o médico aceitar, senão a pessoa surda tem que marcar atempadamente, dizer que vai com um interdito e então aí o médico já está avisado que vai haver uma intervenção a acompanhar e portanto não havia necessidade também desta barreira.
00:28:45:18 – 00:29:14:16
JORGE CORREIA
E olha, tu, nós bocadinho falamos dos sintomas porque o doente se queixa determinados sintomas, Mas depois há outra fase. A fase em que o médico produz um diagnóstico produz um prognóstico. O que é que pode acontecer e decide o que é que o doente deve fazer, se tem que fazer algum tratamento ou o que for. São conhecidos habitualmente em todo o mundo que as profissões muito técnicas, incluindo a dos médicos, falam umas linguagens muito próprias, medicas, uma espécie de medicas.
00:29:14:16 – 00:29:15:23
JORGE CORREIA
Como é que é, como é que desenrasca.
00:29:16:02 – 00:29:24:02
SOFIA FERNANDES
E é o interprete acima de quês é regra geral. O surdo diz não percebi. E então como é que eles passam a língua normal e todos nos entendemos?
00:29:24:02 – 00:29:26:01
JORGE CORREIA
E lá está, vais tu forçar que haja isso?
00:29:26:01 – 00:29:46:13
SOFIA FERNANDES
Eu interpreto uma e dá para perceber por a linguagem corporal da pessoa surda que não está a entender algo, mas são frontais e dizem eu não estou mesmo a perceber nada, preciso que me expliquem outra história. Outras eu percebo e digo às vezes não e faço aquela ponta. Mas queres que eu diga? Mas é melhor dizermos não estás a perceber não sei o quê, porque às vezes, pois também acarretar aquela responsabilidade tua, visto depois explicas.
00:29:46:18 – 00:29:48:01
JORGE CORREIA
Exato. Quando eu faço.
00:29:48:03 – 00:30:08:07
SOFIA FERNANDES
Exatamente e eu prefiro dizer logo não vou assumir essa responsabilidade. Acho que sim. Então é melhor. Efetivamente, não estamos aqui a entender o que está a ser dito. Quando é minha culpa de eu não estar a perceber. Eu própria preciso que repito outra vez o que não percebi, porque se tou a prejudicar a pessoa, não é. Portanto, uma vez regra geral, passa além do normal.
00:30:08:07 – 00:30:29:14
SOFIA FERNANDES
Ou seja, para mim, seja tu a pessoa surda, pior que nós entendemos que eu não sou eu de todo, não terei eu porque há esta ideia? É engraçado porque essa ameaça que se sente não querendo fazer sentir ninguém mal não faz qualquer sentido. Porque eu não tirei uma licenciatura em Matemática, Eu não tirei uma licenciatura em Físico-Química, também não tirei uma licenciatura em Medicina.
00:30:29:15 – 00:30:48:10
SOFIA FERNANDES
Eu não sou federada em absolutamente nada para ser uma ameaça. Portanto, na realidade eu só tirei uma licenciatura de Língua Gestual Portuguesa e é isso que eu faço. A ponte é o facto de a língua portuguesa não ser percebida. Então eu passo para a Língua Gestual Portuguesa. Mas não quer dizer com isso que eu seja um supra sumo de toda a matéria que está a ser dita, não é?
00:30:48:12 – 00:31:05:20
SOFIA FERNANDES
É, pois, habitualmente não é. Agarrando o contexto e apanhando o comboio a primeira. Claro que nós vamos fazendo as nossas associações também, percebendo a matéria, mas a matéria ou o contexto visível ou o que seja. Mas não conseguimos dar uma aula sobre isso. Portanto, não vamos tirar o lugar a ninguém. É impossível.
00:31:06:00 – 00:31:25:15
JORGE CORREIA
Olha tu agora deste mun exemplo muito interessante em termos de comunicação, que é um alguém que não percebe mas está tímido, com medo de poder verbalizar, que não percebeu nada e dito, conseguis interpretar desde logo o movimento das sobrancelhas ou dos olhos. Enfim, como é que é a tua relação com o corpo?
00:31:25:17 – 00:31:46:21
SOFIA FERNANDES
Nós? É engraçado porque a minha disciplina preferida teórica na. Enquanto eu estava na universidade eu tive duas. Uma foi mesmo a parte histórica da cultura e da língua gestual e de como tinha nascido, não em Portugal e no mundo e tal. Envolvem me mesmo muito nessa disciplina. E a outra foi a linguagem, cognição e linguística, linguagem e cognição.
00:31:46:21 – 00:32:18:03
SOFIA FERNANDES
Foi muito engraçado porque estudamos precisamente as microexpressões, Então às tantas estávamos a ver o que é que isso significava, o que é que também é muito engraçado, porque tudo reproduz um significado, não é? Às tantas isto quer dizer temos e às tantas isto quer dizer não sei o quê e era engraçado e eu achei muito engraçado. E depois a linguística, que era a riqueza de como a língua nas, por exemplo, vaca e pata, basta trocar uma letra o B pelo P, bem pata e pata exatamente o B e já troca significado.
00:32:18:09 – 00:32:38:18
SOFIA FERNANDES
E na língua gestual é igual, basta trocar a configuração. Não é? De me ver aqui, basta trocar comportamento de certeza, acreditar. Basta trocar a localização que já muda o significado, por exemplo. Portanto, da mesma forma que a linguística portuguesa, também a linguística da Língua Gestual Portuguesa.
00:32:38:19 – 00:32:43:02
JORGE CORREIA
Tem um dicionário que é um dicionário do gesto e da própria.
00:32:43:04 – 00:33:01:12
SOFIA FERNANDES
Como ele nasce? Onde ele é reproduzido? Como é que ele é feito? Altera significados. Se for feito de outra forma, outro dia foi a um a um a uma mesa redonda e foi muito engraçado. E a pessoa estava lá e disse Acredito eu, também aprendi a língua gestual. A pessoa é muito engraçado, algumas pessoas. Por acaso não foi o caso dessa pessoa em particular, mas algumas coisas assim.
00:33:01:15 – 00:33:11:06
SOFIA FERNANDES
Sim, eu também sei a língua gestual sem ter o meu nome, digamos, mais espetacular, porque realmente está a dar muito rica. Mas pronto, essa pessoa disse assim Olha, por acaso aqui a aparência.
00:33:11:08 – 00:33:12:16
JORGE CORREIA
Eu não sei dizer que é o meu nome.
00:33:12:16 – 00:33:32:19
SOFIA FERNANDES
Epá, eu acho que toda a gente devia de aprender o básico, mas daí a dizer que sabe língua gestual não é de muita piada. Mas isso rapaz, estava a dizer. Olha, uma vez tive uma professora que ensinou um bocadinho de língua gestual e eu sei dizer isto. E eu Nós estávamos a falar sobre e íamos falar sobre o rio e a riqueza do rio e rio assim.
00:33:32:21 – 00:33:53:14
SOFIA FERNANDES
O que é isto? Por quê? E ele queria dizer Língua Gestual Portuguesa E às tantas passa se Não faz língua, faz assim só um indicador ou é o faz toda a diferença? Se eu fizessem ela era língua, mas ele fez um indicador, então aquilo era riu e disse Que engraçado, sabes fazer aquilo? Isso não, eu sei fazer é?
00:33:53:14 – 00:34:09:13
SOFIA FERNANDES
Como é que se faz isso? Disse o que tu tu acabas de fazer ri ele. Isso aí. Então fiz mal porque eu não queria dizer isso. E foi muito engraçado, porque eu só alterou uma a forma da mão e como ele fez, ele fez, riu, não fez língua, ele queria dizer língua. Ele queria dizer eu sei fazer a Língua Gestual Portuguesa.
00:34:09:15 – 00:34:25:00
SOFIA FERNANDES
E fez. Eu sei fazer, ri O gestual português e eu do género olha para ele, isso ai ele sabe fazer, ri, o que é engraçado porque era outro. E amanhã vamos falar sobre o Rio. Sabe que a gente achas? E riu se. Não, não, eu tenho, eu tenho. Eu trabalho. Fazia línguas que estava a fazer e já estava a dizer não estavas tu riu e pronto.
00:34:25:00 – 00:34:48:10
SOFIA FERNANDES
Então ensina me e logo corrigi tudo. Mas foi muito engraçado. Pula, está out. Altera o significado. Isso da parte de responder na pergunta porque sei é que as minhas disciplinas preferidas e perdi me na linguística, mas a linguagem cognição deu me isso, que é a linguagem mesmo. Por isso é que não é língua. Por isso é que nos diz Linguagem gestual portuguesa é uma língua, tem propriedades de uma língua.
00:34:48:12 – 00:35:05:04
SOFIA FERNANDES
Portanto, nós quando vemos um sinal proibido fumar, Ok, vem uma pessoa chinesa, vem uma pessoa, uma vem, uma pessoa surda, o que venha vai saber que naquele sítio não se pode fumar, porque é uma imagem icónica. Nós conseguimos identificar através da linguagem que não se pode fumar.
00:35:05:09 – 00:35:07:23
JORGE CORREIA
E na linguagem gestual é diferente.
00:35:08:00 – 00:35:29:07
SOFIA FERNANDES
A linguagem gestual não é uma linguagem gestual, é uma língua gestual. É língua porque não é icónica a língua. Se eu tiver aqui a falar língua gestual, alguns gestos, vai entender outros gestos. Não vai entender porque é uma língua, tem a sua própria gramática, tem a sua própria forma de ser feita. Portanto, sendo tonelagem entendida por todos, a linguagem é proibido.
00:35:29:07 – 00:35:49:10
SOFIA FERNANDES
Fumar A linguagem é uma forma de como nós posicionamos o nosso corpo, que dá para ver que todos confortável. Dá para ver que eu estou chateado, dá para ver que estou contente. A linguagem corporal ou a linguagem através de símbolos como é proibido fumar, isto é, a linguagem é uma linguagem compreendida por todos. Uma língua não é compreendida por todos.
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SOFIA FERNANDES
A nossa língua portuguesa, se for falada na China, uma pessoa chinesa não consegue entender. Pode ter algumas coisas que entenda. Se nós fizermos miau, o gato lá também vai fazer miau. Você está partido, Eles sabem. Estamos a falar de um gato, mas todas as outras coisas, nós, vamos dizer, não é perceptível para eles, porque é uma língua, tem a sua própria natureza, não é?
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SOFIA FERNANDES
E a língua gestual é igual às tantas. Se eu fizer este gesto, pode entender como bola e é bola. Mas é um gesto icónico. Tem gestos arbitrários e há duas propriedades que decidem que é uma língua ou não é. A língua gestual obedece a essas duas propriedades. Portanto, agora estou a falar na arbitrariedade. Não é que é o facto de o gesto não ser icónico, Mas depois há muitas outras coisas que, sei lá, a adaptação também a um eu peço desculpa a mim por ser linguística.
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SOFIA FERNANDES
Não estou lembrado da palavra mesmo, como é dito, mas por exemplo, o gesto comboio não é Antigamente era a vapor, agora é dos ferros. Tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá. E então o gesto mudou, porque vai evoluindo exatamente na nossa língua também. E nós dizemos não devíamos. Era o comboio, Como é que era? Comboio? A vapor?
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SOFIA FERNANDES
É, hoje em dia é comboio. Já não se diz o vapor porque entretanto foi cortado, porque já não é vapor, já.
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JORGE CORREIA
Não faz sentido.
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SOFIA FERNANDES
Exatamente. E portanto isso também acontece na Língua gestual portuguesa, porque é uma língua, obedece a propriedades de uma língua, a todas as propriedades de uma língua. Portanto, há muita coisa que justifica o facto da língua gestual ser uma língua. Está no livro A gramática na Língua Gestual Portuguesa, que podem consultar e está lá um livro da Gramática da Língua Gestual Portuguesa.
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SOFIA FERNANDES
Está lá duas, Penso que são duas propriedades. Não falha, mas que justificam o motivo de não ser uma linguagem. Não está. Se fosse uma linguagem que era entendida por todos, fosse uma linguagem, nós conseguimos todos falarem quando estávamos a comer e não falamos.
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JORGE CORREIA
É difícil.
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SOFIA FERNANDES
Também educação.
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JORGE CORREIA
Porque essa que tu estás a falar, tu pensar que para alguém da minha geração telefone ainda se faz telefonar a um telefone e eventualmente dar dar ou diz publicamente. E hoje, obviamente isso.
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SOFIA FERNANDES
Fazemos o praticamente só depende do telefone. Lá está.
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JORGE CORREIA
Olha outra das tuas atividades que que eu gostava de ficar aqui na nossa converseta era calma. Um dia estive no meu estádio preferido, que é o Estádio do Dragão, do meu futebol do Porto.
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SOFIA FERNANDES
E partilhamos isso em.
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JORGE CORREIA
Comum e naquele painel de comunicação connosco. Não, não nos outros.
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SOFIA FERNANDES
Somos amigos na mesma e boas pessoas também.
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JORGE CORREIA
De vir a fazer uma interpretação do hino, de uma canção, de uma música e pensei o que é que? O que é que está aqui? Como é que é essa experiência?
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SOFIA FERNANDES
É verdade. Eu tenho que agradecer isso a uma intérprete, minha amiga, que é a a 1000. Ela abre muitas portas na vida e 60.
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JORGE CORREIA
1000 pessoas ali, não é?
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SOFIA FERNANDES
Abriu uma porta do Porto Canal e abriu essa oportunidade na vida de eu poder estar a interpretar no estádio. Que me diz do meu clube do coração, que é o Futebol Clube do Porto. Estava grávida na altura do meu segundo bebé que é o Ivan e que que também deu outro encanto e eu tinha a ideia quando fosse lá o jogo fazer.
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SOFIA FERNANDES
Então o vídeo de eu a interpretar ao mesmo tempo que eu estava a interpretar para fazer uma coisa bonita ao.
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JORGE CORREIA
Vivo, em directo.
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SOFIA FERNANDES
Obviamente vivo e em directo, Eu disse ao meu namorado Bruno, tu vais gravar tudo do início ao fim e eu vou posicionar tu. O Gravas vai estar ao mesmo tempo uma coisa bonita e.
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JORGE CORREIA
Dentro do estádio, ali mesmo no relvado.
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SOFIA FERNANDES
Com a camisola no relvado. Não estava na bancada como os outros não. E também não tenho assim tanta prioridade. E vou eu Começo a estabilizar assim que eu olho para trás e vejo todo o panorama que tem acontecido, desato a chorar e aquilo correu tudo mal. Comecei a chorar do início ao fim, porque foi tal a emoção de estar a interpretar no estádio do meu clube que não estava a conseguir aguentar.
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SOFIA FERNANDES
Então, às tantas ele teve que desligar o vídeo e vir me abraçar um bocadinho, porque eu só recuperei quando o Porto o marcou, que foi aos nove minutos estar absurda. Nove minutos a chorar, uma choradeira autêntica, uma choradeira autêntica. E nesta segunda vez, infelizmente não tive oportunidade. Acho que foi agora no dia 30, mas ainda não consegui confirmar, mas ainda não tive oportunidade de ir não.
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SOFIA FERNANDES
E com dois bebés fica difícil, mas não prometo que não vá ser igual o vídeo vou aí sim, eu já não estou grávida, não estou tão emotiva, sinto que vou conseguir fazer um bom vídeo. Vamos ver se eu consigo olhar para trás outra vez. Embora nem sem essa emoção, porque é muito arrepiante. É uma conquista muito grande. Às tantas, toda a gente está a cantar o hino e as pessoas todas de pé.
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SOFIA FERNANDES
Nós vemos a multidão toda, não é? E eu estou nos ecrãs. E eu E eu penso Meu Deus, como é que eu consegui isto? E por isso é que eu fico tão grata às oportunidades que que vão surgindo na minha vida. E nesta em particular. Fiquei extremamente grata à minha amiga intérprete Amélia Melo, porque efetivamente, ter me dado essa oportunidade será sempre uma gratidão que não vou conseguir retribuir.
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JORGE CORREIA
Como é que se diz golo.
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SOFIA FERNANDES
Golo, entra na baliza?
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JORGE CORREIA
Golo é diferente de golo de quem bebeu o golo?
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SOFIA FERNANDES
Sim, sim, sim, é um golo de água. Sim, sim, não tem nada a ver, não é? Como? Como às tantas, o chapéu pode ser o chapéu ou o chapéu da bola ter passado por cima da cabeça, não é? Por isso é que os robôs interno são aqui um bocadinho diferentes dos intérpretes, porque já há algumas situações de robôs intérpretes que que interpretam já.
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SOFIA FERNANDES
Mas depois falta esta, não. E às tantas houve o chapéu. Ah, o Cristiano Ronaldo fez um chapéu, Vai fazer um chapéu. Quer dizer, não estamos a falar de chapéu, estamos a falar de chapéu usado por cima.
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JORGE CORREIA
Por isso não tens medo que a inteligência artificial derrube o trabalho?
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SOFIA FERNANDES
Não tenho medo, porque o meu trabalho é de pessoas para pessoas e, portanto, as pessoas preferem sempre pessoas. E eu acredito nisso.
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JORGE CORREIA
Sofia, muito obrigado.
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SOFIA FERNANDES
Obrigada. Eu