O programa de hoje é uma viagem sobre a fala do corpo e as dores da alma.
Fala de profundas contradições e de estranhos equilíbrios.
Fala de seres humanos e ser-se humano.
Se vos disser que é uma edição sobre comportamento alimentar, doenças, causas e efeitos, estou a ser redutor.
Este é um programa sobre o amor.
E sobre as questões de pele.
A pele abraçada, aquecida, mimada e beijada.
Do bebé que acabou de nascer ao avô que celebra mais um aniversário em família.
Esse efeito do toque, desde tenra idade, pode significar muito para calibrar a nossa relação entre mente e corpo.
E a ausência do toque causar uma ferida existencial difícil de tapar.
Corpo que fala: ora na pele de galinha da emoção do momento. Da dor de barriga pelo exame da escola. Do peito que se aperta numa angústia maior.
É sobre isso esta edição.
Sobre a necessidade de nos sentirmos bem dentro da nossa pele. Se saber que nos amam de corpo e alma.
E por isso agarram-nos. Com os braços, com os lábios, com os mimos.
E pensar que tudo isto se passa mesmo sem palavras. Apenas com o gesto. Com o olhar.
Já repararam que há olhares de meio segundo que nos insuflam com uma confiança infinita.
E outros, frios ou cínicos que nos despejam a alma da cabeça aos pés.
Só um olhar de um alguém pode comandar-nos como um farrapo de pessoa ou um super-homem com infinitos poderes.
É essa caixa de ferramentas que carrega Dulce Bouça, médica psiquiatra.
Uma caixa de ferramentas carregada de perguntas e muitas respostas, ditas e não ditas.
TÓPICOS:
1. Fala Do Corpo E Dores Da Alma (0:00:13 – 0:15:44) – Discussão sobre a conexão entre mente e corpo, a importância do toque na pele, e a necessidade de nos sentirmos bem dentro da nossa pele. Introdução de Dulce Bossa, especialista em psiquiatria, e a sua abordagem para entender o comportamento humano.
2. Os Olhos Revelam as Emoções (0:15:45 – 0:26:58) – Exploração do universo das emoções e como elas são expressas nos olhos. Discussão sobre a curiosidade como ferramenta para entender sentimentos não verbais e a realidade das doenças comportamentais alimentares.
3. Doenças De Comportamento Alimentar (0:26:59 – 0:42:05) – Exame das diferentes formas de lidar com as nossas relações com os nossos corpos e como as pessoas que sofrem de anorexia nervosa lidam com os seus corpos e as suas tentativas de aprender a aceitá-los.
4. Curando Emoções E Feridas (0:42:06 – 0:43:06) – Discussão sobre cura emocional e regeneração
pessoal. A partilha de pensamentos sobre como lidar com dias difíceis, cuidar da nossa saúde e enfrentar as nossas falhas e tristezas. Abraçar a ideia de que os abraços podem ter poderes curativos.
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0:00:13 – JORGE CORREIA
Olá Viva, bem-vindos ao Pregunto Assimples, o vosso podcast sobre comunicação. As férias estão aí e é tempo de parar, restaurar, recuperar, tempo de vitaminar o corpo com sol, água, sal, comida, ar fresco e amigos. O programa de hoje é uma viagem sobre a fala do corpo e as dores da alma. Fala de profundas contradições e de estranhos equilibrios. Fala de seres humanos e ser-se humano. Se vos disser que é uma edição sobre o comportamento alimentar, doenças, causas e efeitos, estou a ser francamente redutor. É uma edição que vai à causa das coisas, ao corpo que tenha um cérebro, ao cérebro que talvez tenha uma mente, e esse delicado equilíbrio que às vezes se contradiz, depende mais dos afetos do que da vontade ou as simples recusas de comer. Vamos saber tudo durante esta edição.
Este é um programa sobre o amor, sobre as questões de pele, a pele que é abraçada, aquecida, mimada e beijada, do bebê que acabou de nascer ao avô que se celebra mais um aniversário em família. Esse efeito do toque na pele deste enredado pode significar muito para calibrar a nossa relação entre mente e corpo, no fundo, a relação entre nós e nós mesmos, entre corpo e alma, e a ausência do toque pode causar uma ferida existencial difícil de tapar. O corpo que fala ora na pele, galinha de emoção do momento da dor de barriga pelo exame na escola, do peito que se aperta no mangustia maior. É sobre isto esta edição, sobre a necessidade de nos sentirmos bem dentro da nossa pele, de saber se nos amam do corpo e alma e por isso nos agarram com os abraços, com os lábios, com os mimos. E pensar que tudo isto se passa mesmo sem palavras, apenas com o gesto, apenas com um olhar. Já repararam que há olhares de meio segundo, que nos insuflam, como a confiança infinita, e outros, frios ou sinicos, que nos despejam a alma da cabeça aos pés.
Só um olhar, um olhar de algo em pó de comandarmos, como um farrapo humano ou como um super homem com infinitos poderes. É essa caixa de ferramentas que carrega Dulce Bossa, médica Psiquiatra. Uma caixa de ferramentas carregada de perguntas e muitas respostas ditas e não ditas. Dulce Bossa, médica Psiquiatra, posso apresentá-la como especialista em doenças de comportamento alimentar? ou isso é demasiado pequeno para a atividade que faz o que?
0:02:58 – DULCE BOUÇA
é Não, não é o meu eixo principal.
0:03:01 – JORGE CORREIA
É esse o ponto que ocupo aos seus dias.
0:03:04 – DULCE BOUÇA
É a questão que eu mais gosto de tratar.
0:03:08 – JORGE CORREIA
Qual é o seu poder secreto?
0:03:10 – DULCE BOUÇA
Não tenho O seu super poder. Não tenho poder secreto. tenho uma grande curiosidade por aquilo que se passa com as pessoas e isso leva-me a ir descobrindo muita coisa que não aprendi nos livros, nem no curso, nem, Mas aprendi conversando com as pessoas.
0:03:26 – JORGE CORREIA
Ouvindo as pessoas.
0:03:26 – DULCE BOUÇA
Ouvindo as pessoas. As pessoas respondem a tudo e explicam tudo.
0:03:30 – JORGE CORREIA
A séria.
0:03:30 – DULCE BOUÇA
A séria.
0:03:32 – JORGE CORREIA
Tudo nos ditos ou algumas vezes nos não ditos.
0:03:36 – DULCE BOUÇA
Algumas vezes nos não ditos, mas eu considero que nas psicotrapias e nas pessoas eu não sei na psiquiatria não se deve interpretar. Deve-se interpretar o menos possível. Não estou na linha psicanalítica Deve-se clarificar. Portanto, quando as pessoas há qualquer coisa do não dito que é comunicado, a minha perspetiva é clarificar. Quer dizer o quê? O que é que está a querer comunicar, o que é que estou a perceber nos seus olhos e que não sei se é exatamente o que me está a querer comunicar? E portanto é assim que vamos a dizer.
0:04:12 – JORGE CORREIA
Eu pensava que os psiquiatras, a sua função principal, a sua tarefa principal no mundo era interpretar-nos.
0:04:19 – DULCE BOUÇA
Pois, essa é uma linha e uma forma de ver a psiquiatria, e uma forma de se atuar dentro da psiquiatria, e uma que eu propriamente não sico.
0:04:29 – JORGE CORREIA
Então é esse interessa-me saber, esse olhar nos olhos, esse não dito o Olhas para mim. Estás a tentar dizer-me alguma coisa, mas não consegue desverbalizar.
0:04:41 – DULCE BOUÇA
Não é tanto. Não consegue desverbalizar, porque aí eu estou já a classificar o que a pessoa está a conseguir ou não conseguir fazer É mais. Não sei se estou a conseguir perceber o que me quero transmitir.
0:04:54 – JORGE CORREIA
E vai sempre um nível mais fundo.
0:04:56 – DULCE BOUÇA
Às vezes, outras vezes passam-se para o básico, para o real, para o concreto, para perguntas muito básicas, como acho que está um bocadinho irritada, ou não, ou acho que hoje há uma luz que vem de si, que está e que me parece que o dia foi bom.
0:05:15 – JORGE CORREIA
Mas entre a provocação e o acolhimento.
0:05:18 – DULCE BOUÇA
Não, a minha ideia não é provocar. A minha ideia é poder oferecer àquela pessoa um espaço de confiança em que ela possa transmitir-me aquilo que muitas vezes guarda dentro dela com o sofrimento ou como ao estar, ou sem saber organizar-se dentro de tudo aquilo que sente, e que possa confiar em mim e portanto conversar comigo e portanto que possa dar a sua opinião e eu dar a minha resposta, porque eu sou dos psiquiatras que falo muito e não falo pouco. Aham, sim, sim, não, não, não.
0:05:51 – JORGE CORREIA
Vai lá. Eu gosto de falar com as pessoas, Então quando alguém entra aqui por esta porta, estamos a gravar no seu consultório. Pregunte-lhe aqui algo que vem.
0:06:03 – DULCE BOUÇA
Em que é que você pode ajudar?
0:06:04 – JORGE CORREIA
Em que você pode ajudar. Há um doente tipo, uma doente tipo que recebe não?
0:06:09 – DULCE BOUÇA
Não, a grande maioria dos doentes que eu recebo há muitos anos são doentes com doença de comportamento alimentário, porque foi no que eu me especilizei. Mas continuo a ver doentes com depressões, com depressões de pânico, com depressões da ansiedade, com tristeza. não depressão pessoas. Então onde é que está a fronteira? A fronteira é bem limitada. Uma tristeza que não é uma depressão, é uma reação, um acontecimento de vida que me agrou mas que é ultrapassável. É ultrapassável desde que a pessoa consiga compreender onde está e por onde é. que é que é isso?
0:06:45 – JORGE CORREIA
E é um processo benigno no fundo.
0:06:47 – DULCE BOUÇA
Sim, é um processo normal.
0:06:48 – JORGE CORREIA
Temos que Normal, temos o nosso sofrimento, a nossa alegria, o nosso sofrimento, e estamos aqui, sempre aqui, a avaliar entre as duas coisas A depressão, aí já estamos a falar de outra coisa, mais séria e mais profunda.
0:06:58 – DULCE BOUÇA
Não, muito mais séria, porque a depressão tem uma raiz biológica da constituição do próprio e é por isso que muitas vezes as pessoas com depressão são mal acolhidas, são mal orientadas e não gostam de hidrópsiciatra As próprias pessoas. Sim, eu acho que ninguém gosta de hidrópsiciatra.
0:07:19 – JORGE CORREIA
Então, como é? que é de que nos desventem a alma O?
0:07:21 – DULCE BOUÇA
psiquiatra leia por dentro o que se passa e que a pessoa não quer desvendar.
0:07:27 – JORGE CORREIA
Ah, eu quero guardar aqui este segredo, que não é.
0:07:29 – DULCE BOUÇA
Que é irreal. um psiquiatra não leia nada por dentro. Um psiquiatra houve conversa com a pessoa, partilha os seus pensamentos de psiquiatra e houve os pensamentos de pessoa e depois constrói-se aqui qualquer coisa que é construída em comum E implica-se pessoalmente nessa relação?
0:07:48 – JORGE CORREIA
Claro que se implica, porque uma coisa é dizer assim, mal comparado, se eu for levar o meu carro a um mecânico, um mecânico que tem uma relação com o carro e uma relação por um lado quase transaccional, por outro lado resolve o meu problema Nos médicos de alguma maneira. Olha, dê-me aqui a barriga, veja lá o que que se pode fazer por mim. Os psiquiatras não os psiquiatras usam a linguagem para conseguir entrar, ou permitir entrar no cérebro de cada um neste diálogo.
0:08:18 – DULCE BOUÇA
A linguagem é sobretudo a observação, mais do que o linguagem observar uma pessoa, ouvila e tentar acompanhar, pontos no lugar dela aquilo que ela está a querer transmitir, e não adivinha nada. Intui algumas coisas, precipõem algumas coisas, mas o psiquiatra não adivinha nada A Ixete, se for conduzido por teorias. Todas as teorias psíquicas e psiquiátricas foram muito úteis para todos nós que aprendemos, muito úteis Para a base, para a base que nos acompanham, para o resto da vida, que de vez em quando lá vamos revisitar alguma coisa. Que disse o Vinicote, o Freud, o Jung, muitos psiquiatras nos antecederam e muitos atuais. Mas a interpretação, interpretar o que a pessoa está a querer dizer, responder, explicar pela pessoa, é qualquer coisa que tira completamente a criatividade ao próprio pessoa. A pessoa fica colada à interpretação.
0:09:21 – JORGE CORREIA
Na minha perspectiva, Portanto é quase um preconceito do conhecimento Se eu se relegar numa régua, na régua do Freud ou noutra qualquer, e colocar sobre aquela pessoa A Ixete não serve para nada.
0:09:33 – DULCE BOUÇA
O que eu aprendi do Freud serviu para mim, para eu pensar sobre as pessoas e para eu poder utilizar pensando dentro de mim própria, não sobre aquilo que a pessoa está a dizer Interpretar e rejar uma teoria para explicar o que a pessoa está a dizer. E uma causa e uma explicação. Eu acho não ser para nada, porque o importante é perceber qual é a história daquela pessoa e por que ela está aqui e por que ela vai falar comigo, porque ir um psiquiatra ou ir um médico é uma decisão muito difícil. É uma decisão de sair da sua própria vida, que controla, e do seu conforto e do seu bem malestar, mas da sua vida habitual. E o Freud é um pessoa que não conhece, não sabe o que vai dizer sobre ela, o que vai orientar, se vai controlar a sua vida, se vai dar indicações do que deve ser ou não, e portanto é uma decisão muito difícil.
Eu acho que hoje em dia não tem nada a ver com há 30 ou 40 anos, com a ideia do que era o psiquiatra. Hoje não tem nada a ver, aliás, tem a vida. Algumas pessoas das artes e do cinema que têm, o Diola por exemplo, desmontou muito esta ideia de que ir ao psiquiatra é uma coisa terrível, embora a própria experiência dele nos psiquiatras, com os psiquiatras nos filmes, é uma coisa um bocadinha assustadora. Mas a pessoa vai a um psiquiatra porque tem um sofrimento, e é um sofrimento que não é localizado numa parte física, o que é que lhe dizem.
0:11:05 – JORGE CORREIA
Vamos centrar-nos na questão alimentar. Como interessa estas condições, estas doenças? como é que ele pode? nos ferir As pessoas entram aqui no consultório alguém com uma dessas condições e queixam-se de que habitualmente Nada. Nada, está tudo bem.
0:11:23 – DULCE BOUÇA
Não está tudo bem, Mas viram o que Viram, porque a família os obrigou. Não está tudo bem, mas desconfiou muito do que aquela pessoa lhes vai fazer E portanto a primeira.
0:11:34 – JORGE CORREIA
Ela está a confiança.
0:11:35 – DULCE BOUÇA
Não é Sim, e tem razão. Eu acho que tem razão porque as doenças de comportamento alimentar são doenças médicas, sendo que a psiquiatria é uma especialidade médica Mas as doenças de comportamento alimentar tratam do sofrimento emocional e psicológico que está centrado num corpo E o corpo é o principal amigo ou inimigo nos gondos, na vida, No corpo é que tudo se passa. Há uma ideia um pouco romântica de que o cérebro é que é o órgão de eleição e portanto o cérebro controla tudo.
0:12:14 – JORGE CORREIA
E o resto é carcaça.
0:12:16 – DULCE BOUÇA
Ora, bem, e isso leva a que muitas pessoas pensem assim eu estou deprimida, tenho uma depressão, mas eu hei de ser capaz de controlar isto Porque com o meu pensamento, a minha pessoa, o meu cérebro há de ser capaz de controlar isto. não preciso de me retratar.
0:12:31 – JORGE CORREIA
Às vezes é verdade ou não? Às vezes é Há umas pessoas que de facto têm essa.
0:12:37 – DULCE BOUÇA
Às vezes é, mas se calhar não são verdadeiramente as graves depressões.
0:12:39 – JORGE CORREIA
As graves depressões são biológicas são biológicas.
0:12:42 – DULCE BOUÇA
Tanto, ali lá está umas sertorinas, umas, não sei do que vale, mas Há uma constituição biológica que nos acompanha, que vem conosco desde nascemos também e de vez em quando, por alguma razão, despoleta uma desorganização do funcionamento mental que se repercute sempre no funcionamento de todos os órgãos, assim como Não será a nossa cabeça, a nossa criação, a nossa figa, nos nossos rins.
Nosso intestino, a nossa figa dos nossos, O nosso esqueleto, os nossos músculos, A nossa pele, a nossa pele que é aquilo larga, incrível, que cobre todo o corpo e que guarda tudo que se passa dentro do corpo e projeta por exterior tudo que vem dentro do corpo. Quando estamos mais ansiosos, lá está, ficamos com coisas na pele mais ansiosos, mais tristes, mais depressos, mais angustiados, mais perplexos, mais confusos.
0:13:43 – JORGE CORREIA
O espelho é o nosso grande amigo ou a nossa grande ameaça.
0:13:47 – DULCE BOUÇA
O espelho é um objeto de decoração que nós temos em casa E que serve para, de vez em quando, irmos olhar e perceber como é que eu estou hoje. Mas o espelho dá uma imagem estática. O espelho não dá uma imagem em movimento, não dá uma imagem de vida. O espelho é uma espécie de fotografia. Está a ver uma imagem projetada que é uma fotografia.
0:14:14 – JORGE CORREIA
Não está a vermos espelho sentimentos, emoções, confusões, guerras angústias, e se vemos para dentro ou vemos naqueles que nos são mais próximos.
0:14:25 – DULCE BOUÇA
De as duas maneiras Vemos para dentro e vemos na relação que temos com os outros e no que percebemos que os outros estão também a ver em nós, no que os outros projetam em nós.
0:14:35 – JORGE CORREIA
Podemos recolher a imensa generosidade para um lado das pessoas que gostam de nós e têm cuidado conosco, mas ao mesmo tempo podemos recolher o olhar de julgamento ou de crítica Ou de insatisfação ou desilusão. Olha está tão gorda. Olha está tão magra. Estou a usar a.
0:14:55 – DULCE BOUÇA
Às vezes não é preciso dizer Basta olhar, hein, basta olhar. E um dia eu perguntei aos meus netos pequeninhos tinham três anos, mais que Quatro e a dois E perguntei-lhes, e às vezes perguntei só aos dentes, perguntei-lhes e fezi uma ideia que me surgiu como é que nós sabemos que as pessoas gostam de nós, que é a grande incógnita na nossa vida? Nós não É difícil de sabermos exatamente quem gosta de nós. Conseguimos saber, claro, mas não é uma coisa fácil, mas cada perguntar às vezes não é.
0:15:30 – JORGE CORREIA
Isso acha na bola perna Por que Podem desmentir?
0:15:34 – DULCE BOUÇA
Podem dizer gosto imenso, mas. Mas gosta como? Mas gosta de quê? Mas gosta também dos meus defeitos, mas gosta das minhas fragilidades, Mas gosta quando eu falho, mas só gosta quando eu tenho sucesso. Portanto, eu acho que não faz sentido perguntar, Acho que nunca faz sentido perguntar a ninguém se gosta de nós. Acho que nós temos que aprender a ver isso E aos meus netos pequeninos é curioso que eles os lembram dessa pergunta e da resposta E eu disse-lhes que nós sabemos quem gosta de nós pelos olhos.
0:16:05 – JORGE CORREIA
Sem palavra.
0:16:06 – DULCE BOUÇA
Temos que aprender a ler o que os olhos das pessoas nos dizem, e aí nós conseguimos perceber.
0:16:12 – JORGE CORREIA
E lá está nos olhos. Podemos ver a emoção, a generosidade, a entrega, o cinismo.
0:16:17 – DULCE BOUÇA
Podemos? claro que sim. E o amor, e a raiva, e a zanga, e o cinzento. Há pessoas que experimentam mal as suas emoções, que é tudo muito cinzento E portanto não conseguimos perceber o que é luminoso, o que é mais negro, o que é mais triste. Essa é muita das conversas que temos aqui neste cabineto.
0:16:41 – JORGE CORREIA
Mas essa subjetividade, porque, no fundo, o dismo que dizem os teus olhos, a uns olhos que são muito claros. Há momentos em que, nos momentos de paixão, nos momentos de raiva, se calhar, os olhos falam muito alto. Há momentos muito baços, claro que há A indiferença, por exemplo. É um sentimento que eu imagino muito baço mais que a taratas no olhar.
0:17:03 – DULCE BOUÇA
Mas por exemplo, uma pessoa deprimida não quer dizer que não sinta amor e afeto. Pode não conseguir transmitir-o.
0:17:11 – JORGE CORREIA
Está nesta dezada, está A pática, no fundo não é.
0:17:15 – DULCE BOUÇA
Está virada para dentro dela e fechada E portanto é difícil comunicar o que sente de bom e não bom. Está isolada do mundo. Que abre-latas é que usa O da minha curiosidade.
0:17:31 – JORGE CORREIA
Vai tentar perceber, vai tentar perguntar.
0:17:33 – DULCE BOUÇA
É isso ajuda muito na minha desde sempre, desde que eu decidi para a psiquiatria, Minha curiosidade em perceber as pessoas e a vida.
0:17:43 – JORGE CORREIA
No caso das doenças de comportamento alimentar, tenho a ideia posso ser já desmentido de imediato de que há uma componente de género. Quando eu penso nas anoraxias, por exemplo, estou a pensar em raparigas, jovens, adolescentes ou pre-adlucentes. Eusche, mais a alguma sentido Estou, estou a ser redutor.
0:18:02 – DULCE BOUÇA
Não é aquilo que tem observado, é aquilo que tem ouvido, é aquilo que tem lido, é aquilo que tem constratado. Agora, neste gabinete passam muitos rapazes.
0:18:12 – JORGE CORREIA
Também.
0:18:13 – DULCE BOUÇA
E rapazinhos muito jovens com 10, 11, 12 anos Tão cedo.
0:18:17 – JORGE CORREIA
Sim O que lhes dói.
0:18:19 – DULCE BOUÇA
Porque a anorexia e a bulimia não são manias de magreza, Não são uma perseguição do ideal de magreza. Esse é o que se disse Durante muitos anos.
0:18:31 – JORGE CORREIA
Que é aquela coisa do estás tão magre a rapariga, vê lá se comes. ou, neste caso, estás tão magre Quantos anos, diz.
0:18:36 – DULCE BOUÇA
Portanto, é impossível compreender como é que uma rapaz ou uma rapariga ou uma mulher ou um homem todos passam Por estes locais onde se fala destas doenças. É impossível perceber como é que uma pessoa está descarnada, como é que uma pessoa está desnutrida e continua a não reconhecer que está muito mal, mas não é porque quer estar assim. Em 30 anos da minha profissão, lidar com estas pessoas, nunca encontrei nenhuma anoretica, nenhuma bulimia que quisesse continuar a anoretica e bulimia.
0:19:11 – JORGE CORREIA
E então, o que é que as impede no fundo de?
0:19:15 – DULCE BOUÇA
Fale-lhe dizer porque é uma ideia que se tem sobre estas doenças muito recente, de há uns 10 anos para cá, e a ideia não é minha, mas é partilhada totalmente por mim. Durante muitos anos eu e as pessoas todas com quem eu trabalhava e mestres com quem eu trabalhei, com quem aprendi que não vamos dizer assim. Para se ter uma anorexia é preciso ter uma constituição própria. Não é qualquer pessoa que começa com uma dieta e que cai numa anorexia. Uma bulimia já é uma coisa diferente E as doenças bulímicas gostariam de ser um bocadinho anoréticas, mas não conseguem.
Portanto, há qualquer coisa que é constitucional E tem havido muita investigação ao longo dos anos, da genética, do que se transmite e de alguns genes já identificados e tal, e eu durante muitos anos interroguei-me muito sobre o que é isto da constituição. Quer dizer, a gente explica isto, as pessoas não lhes sabem explicar outra coisa. Portanto, o que é isto de vulnerabilidade? Há uma vulnerabilidade para ter estas doenças E é verdade, nem toda a gente tem uma anorexia quando faz dieta, quando perde peso e quando ninguém fica desnutrido, e ninguém não é toda a gente.
0:20:21 – JORGE CORREIA
Pelo contrário. Até quando alguém quer fazer, até lutar ao contrário.
0:20:25 – DULCE BOUÇA
É difícil fazer. Muito difícil. Só as anoréticas é que conseguem.
0:20:31 – JORGE CORREIA
Portanto na realidade, tenho um poder que pode ser uma catástrofe.
0:20:35 – DULCE BOUÇA
Não é um poder.
0:20:37 – JORGE CORREIA
Não é uma vulnerabilidade.
0:20:39 – DULCE BOUÇA
É, E há uns anos para cá. Há alguns psiquiatras europeus que se interessam imensamente por estas questões, Um dos quais eu sinto, porque foi a pessoa que um dia ouvi-lo falar. Eu tive uma espécie de uma epifania e tive a resposta à pergunta que durante uns anos não tinha. É curioso, Mas isto na vida é curioso porque às vezes, enquanto há momentos em que as coisas se manifestam, Uma epifania Foi o que eu senti. Ele estava a falar da anorexia da Jovem Nistanghelini e estava a falar da ideia dele e dos estudos últimos sobre anorexia, Também a bulimia, mas mais anorexia, E a certa altura disse que estas noentas têm.
Nós temos um sistema no nosso cérebro que tem duas funções fundamentais para nós nos equilibrarmos no nosso corpo e na vida E que são a própria acepção e a interecepção. A própria acepção é a noção que nós temos do corpo. Cada um de nós tem uma noção que não é absolutamente exata. Se fizer esta pergunta a alguém, como é que sente-se o teu corpo? as pessoas ficam amarelhadas e não sabem muito para explicar Pessoas sem doença, pessoas, todos nós. A interecepção é uma noção do que está passado dentro do corpo e nos órgãos, tendo-me a ser capaz de perceber, mas toma-me que está a funcionar bem, meu intestino não está a funcionar bem De ouvir o nosso corpo.
De ouvir, o sentir, o mais sentir que eu vi. Estas pessoas que têm anorexia nervosa têm algo que sabe agora, porque a curiosidade, o estímulo e o fascínio da ciência é que está sempre avançar E está sempre a descobrir coisas e a alterar teorias antigas. Para outras É que eu faço o estímulo da ciência e há um autor da filosofia da ciência que se chama Paul Feierbandt e que tem um livro que se chama Contra o Método E é um livro sobre a filosofia das ciências. Mas para mim a frase principal daquele livro diz para se fazer ciência, qualquer coisa serve. É a chave principal para mim daquele livro. E é verdade que as coisas vão mudando e vão substituindo teorias antigas com base nas antigas, porque não é nada elixo, só que vai se acumulando experiências sobre aquilo que já sabe.
0:23:05 – JORGE CORREIA
Vamos limpar de uma as restas, vamos evoluindo, vamos colocando mais uma pedra no castelo E acrescentando e modificando e pensando a final não era bem assim.
0:23:11 – DULCE BOUÇA
A final isto vai mostrar que é um bocadinho de outra maneira E portanto ele explicou que nestas doentes a intereceptão e a própria excepção, a noção de si próprios está muito fragilizada. E isto pode ser genético. Pode ter nascido com a pessoa, pode ter resultado de um trauma grave muito precoce na infância, pode ter resultado de maus tratos e abusos na infância. Pode ter resultado de situações de pouco contacto físico levado a cabo com afeto, portanto pode ter havido pouco toque.
0:23:46 – JORGE CORREIA
Falta de amor, de beijos, de abraço, de cola.
0:23:50 – DULCE BOUÇA
Pelo toque. Pelo toque, o contacto de pele com pele. É por isso que eu digo que a pele é um órgão fantástico e conduzir-se de tudo. Há muitas crianças que são muito bem tratadas e são muitas madres, mas que as famílias, as mães, os pais, seja quem for, despegam um pouco E portanto há hoje muitos estudos sobre isso, a importância do toque na infância e percoce para o desenvolvimento da personalidade.
0:24:12 – JORGE CORREIA
Pensava que isso era uma coisa tão natural como ver água.
0:24:18 – DULCE BOUÇA
Idealmente, idealmente seria assim, utópicamente seria assim.
0:24:25 – JORGE CORREIA
Estão a gostar do Pregunta Simples estão a gostar deste episódio. Sabia que um gesto seu me pode ajudar a encontrar e convencer novos e bons comunicadores para gravar um programa. Que gesta é esse Subscrever Na página PreguntaSimplescom. Tem lá toda a informação de como pode subscrever. Pode ser por email, mas pode ser ainda mais fácil subscrevendo no seu telemóvel através de aplicações gratuitas como o Spotify, o Apple ou o Google Podcasts, assim cada vez que houver um novo episódio ele aparece de forma mágica no seu telefone. É a melhor forma de escutar o Pregunto da Simples. Assalta-me uma dúvida O que raio tem em se ver com a comida?
0:25:09 – DULCE BOUÇA
Tem a ver com o seguinte é isso mesmo Quando a pessoa não tem noção do seu próprio corpo e não tem noção da dimensão e da forma do seu próprio corpo, primeiro faz da sua vida uma saga de procura como é que é o meu corpo? comparando-se com os outros? Portanto, está sempre a comparar-se com o corpo dos outros e define um meio para conseguir ter uma ideia disso que falha, sempre que é o peso na balança. Se eu pesar 49, estou bem. Se eu pesar 50, já estou mal. Se eu pesar 47, estou bem. Se eu pesar 40, estou bem. Se pesar com 42, já não tenho noção do meu corpo.
A noção do meu corpo, o espaço que ele ocupa e como é que ele é estamos a falar de corpo físico Está diminuída nessas pessoas E portanto um dia, como lhe disse há pouco, os doentes dizem de tudo. Basta nós perguntarmos. Perguntei a um adolescente, 13 anos, naquela altura em que o corpo está em mudança permanente e portanto que os jovens estão a comparar-os com os outros e a tentar perceber qual é o seu valor através de comparar-os com os outros, e perguntei a uma jovem como é que te sentes no teu corpo? Aliás, pergunto-te isso agora muito a toda a gente e já tirei muitas conclusões a partir daí, desde que tive esta epifania com este psiquiado italiano e ela disse-me sinto-me gorda. Eu disse gorda, mas o que é gorda? Gorda é palavra utilizada na comunicação entre os dois, gorda é palavra cultural.
0:26:52 – JORGE CORREIA
Você está mais gorda Gorda é palavra cultural Ou estás tão magra.
0:26:59 – DULCE BOUÇA
Não se percebe muito bem o que é dizer gorda, porque não se está a ver gordura. Não se percebe muito bem o que é dizer. Eu perguntei-me o que é gorda E era-me rapiriga que está muito magra, muito imagrecida, Mas gorda como O que é gorda. Eu perguntei o que eu fiz O que é gorda? Parece-me que me pergunta tola, Há psiquiatra?
0:27:18 – JORGE CORREIA
As pessoas que estivam os meus psiquiatras fazem perguntas. tolas Psiquiatras fazem perguntas tolas.
0:27:23 – DULCE BOUÇA
Psiquiatras são um bocadinho tolos Ou fingem que são tolos. Não fingem, não Acho que não Quer dizer haverá alguns que fingem. Em todas as profissões há quem eu use bem e quem eu use mal, mas não acho que não se finge. Acho que se levantam questões.
0:27:37 – JORGE CORREIA
Que responde esta rapiriga?
0:27:39 – DULCE BOUÇA
Respondeu a uma coisa fantástica. Diz-me assim. A minha sensação é que o meu corpo está sempre a mudar, todos os dias a mudar, e portanto eu não sei em que é que ele se vai adornar e como é que ele é.
0:27:51 – JORGE CORREIA
Eu não sei com o que conto.
0:27:54 – DULCE BOUÇA
Não sei como é que vai ser o meu corpo daqui a um tempo. Não sei como é que é.
0:27:57 – JORGE CORREIA
Isto gera que a insegurança.
0:28:00 – DULCE BOUÇA
Isto gera uma sensação de estar a enchar permanentemente.
0:28:04 – JORGE CORREIA
E portanto.
0:28:05 – DULCE BOUÇA
E portanto se incomoda.
0:28:08 – JORGE CORREIA
Queria contramedidas para fazer exatamente o contrário.
0:28:10 – DULCE BOUÇA
Eu tenho que ter noção de como é que é o meu corpo. E curiosamente, curiosamente não, mas na anorexia nervosa aquilo que as pessoas costumavam dizer muito e que eu também disse durante muitos anos até a pensar de outra maneira. e aqui as anoreticas fazem muito exercício, muito exercício, muito exercício. que a minha, muito que a minha, muito para emagrecer. Mas não é para emagrecer, porque a ales uma já estão muito mágicas. Então é para que, é para ter a inocção do corpo.
0:28:40 – JORGE CORREIA
Porque ao fazer o exercício físico sentimos os músculos da imaclá. Ah, É. Estou absolutamente surpreendido.
0:28:49 – DULCE BOUÇA
Há muitas anoresticas que tomam um duos de água a ferver, ficando até com algumas caminhaduras no corpo, ou água gelada, exatamente para sentir o corpo.
0:29:01 – JORGE CORREIA
Portanto precisam de quase estremar esse sentimento de vida, de questão cá de que tenham um corpo de que não há propriação de seu próprio corpo.
0:29:13 – DULCE BOUÇA
Precisam de conhecer o corpo porque sem corpo não conseguimos viver. Não é o cérebro que nos conduz para viver, o corpo é o que nos leva aos outros E como ninguém vive sozinho, vivemos com os outros e somos os outros. É preciso conhecer o nosso corpo, as capacidades, as dificuldades, as fraquezas E portanto tratar estas doenças. É ajudar as pessoas a conhecer o seu corpo.
0:29:35 – JORGE CORREIA
Pergunto no caso dos casos extremos E as pessoas que sabem que todos sabemos, não é Que se não o mesmo morremos?
0:29:48 – DULCE BOUÇA
As pessoas com a anoraxia não sabem.
0:29:50 – JORGE CORREIA
Mas querem morrer, é Não.
0:29:54 – DULCE BOUÇA
As pessoas com a anoraxia, algumas para dar a dizer constancias da vida e os muitos anos de doença e tudo a falhar, algumas suicidam-se, mas são poucas As doenças com a anoraxia nervosa. Não querem morrer, nem com polimia. Querem viver, mas não sabem como é que eles vivem, porque não sabem o que fazer com o seu corpo.
0:30:16 – JORGE CORREIA
Mas sabem que o caminho, se continuar em aquele percurso é É inevitável. Não acreditam.
0:30:26 – DULCE BOUÇA
Não acreditam Nenhuma anorética, por mais uma crescida descarnada em caixia, daqui a uns, precisam de ser entrenadas ou então morrem, e algumas morrem Porque não foram tratadas, já não se conseguiam fazer nada. Nenhuma delas acredita que pode morrer, acredita sempre que pode continuar a viver assim E quer ajuda. Que isto é incrível É que estas doentes É isso que é preciso que os médicos E percebam isto Uma doente que diz não como não quer, não como falte, não vem, não como Não é porque não quer ajuda, é porque tem um enorme medo do que vem a seguir E portanto não quer arriscar-te uma falsa sensação que adquiriu um poder sobre o seu corpo, que não tem poder nenhum. Perdeu completamente o controle do corpo quando chegou a uma anorexia grave, mas tem a noção, foi tanto tempo a treinar aquela controle do corpo que tem um enorme medo do que é o que acontece Se abandonar aquele comportamento. Portanto, todas as pessoas com a doença de comportamento alimentar querem ser ajudadas. Isto é uma declaração que eu faço, sem nenhuma dúvida. Algumas não são, algumas não aguentam e desistem.
0:31:35 – JORGE CORREIA
Precisam de ser convencidas.
0:31:38 – DULCE BOUÇA
Não Precisam de lhes ser dado em muitas conversas uma noção de confiança de que podem arriscar e de que tenham sempre a possibilidade de se arriscarem, de que podem voltar atrás. Acontece. Qualquer pessoa, como a anorexia nervosa, como a polemia, que entrou num caminho de enorme sofrimento, sabe que se começar a tratar se não quer voltar atrás.
0:32:05 – JORGE CORREIA
Mais uma contradição.
0:32:07 – DULCE BOUÇA
Mais as contradições da mente humana, do ser humano e da vida.
0:32:12 – JORGE CORREIA
Então, e como é que, para alguém que tem os olhos de uma parida e que está a ver à sua frente um caminho que vai ter a catástrofe se não for possível resgatar aquela pessoa, consegue simultaneamente respeitar essa profunda autonomia daquele ser humano e, ao mesmo tempo, ajudar aquela pessoa a sair dali?
0:32:38 – DULCE BOUÇA
Onde é que está a fronteira. É a minha intenção inabalável de respeitar completamente a autoterminação e aquilo que a pessoa quer. Mas isso não me impede de dizer à pessoa mas eu vou estar aqui consigo e vou continuar consigo e não vou abandoná-la se você não quiser, e podemos falar sobre a sua vida, assim, com esta doença, Mas vive-la um bocadinho melhor, aprender, maximizar um bocadinho as suas capacidades, mas eu vou estar consigo e vou acompanhar-la, nisso E quando quiser, pode ser uma hora quando achar que já não quero, mas eu vou estar aqui e não vou desistir. E portanto, mesmo que me diga eu não quero, eu não vou desistir Porque acho que quando você perceber como é que pode viver a vida fora desta doença, vai ser uma nova vida, uma nova luz que me passa a vida E portanto que é também outra coisa que as pessoas têm medo. Se eu sair disto em que estou há muito tempo, eu sei lá se vale a pena viver da outra maneira.
0:33:34 – JORGE CORREIA
Até porque, no fundo, há uma maneira que estão a ser o centro das atenções também.
0:33:39 – DULCE BOUÇA
Não estão a ser o centro dos olhares críticos, principalmente críticos. Isso que é difícil.
0:33:45 – JORGE CORREIA
Mas isso é mau, se sentir isso é mau, imagino, todos os dias.
0:33:48 – DULCE BOUÇA
Pois é mau, mas é o que acontece, porque a verdade é que as famílias, que também não têm que saber o que são as doenças, têm que ter estas explicações, nem têm que ser psiquiatras. São famílias, são pais, vivem um sufrimento horrível haver um filho que se recusar a comer ou que come e fomita E portanto os pais estão com o olhar sempre em cima a tentar empurrar para que elas compreendam.
0:34:11 – JORGE CORREIA
Ajuda ou atrapalha isso? Atrapalha, atrapalha.
0:34:14 – DULCE BOUÇA
Sim, por isso é que o papel do psiquiatra é trabalhar também com os pais para eles explicar o que é que é a doença e o que é que não faz sentido fazer.
0:34:20 – JORGE CORREIA
Genéricamente as famílias vêm dar uma boa ajuda ou há momentos em que tem que fechar a dia aqui a porta do gabinete e dizer isto agora aqui é entre nós os dois. Não, isso há sempre. Isso há sempre, há sempre. Isso não é.
0:34:33 – DULCE BOUÇA
Em todos os acompanhamentos. Há sempre um momento eu digo agora, se não se importa, onde deixamos sozinha, com ela ou com ela, mas há também sempre um momento em que os pais entram e são ouvidos na presença da doença e dizem tudo o que os faz sofrer e as suas dificuldades. E é repetido muito esta frase. Nós não sabemos lidar com isto. Não sabemos o que é que a viemos de fazer se forçamos, se não forçamos, se ralhamos, se não ralhamos, se deixamos. Não sabemos o que é que a viemos de fazer. Por favor, ensinem-nos E esta frase repete-se muitas vezes de atrapia do mesmo doente, porque aquilo é muito complicado. Viver como a doente ou um doente com esta patologia É um grande sofrimento para os pais.
0:35:14 – JORGE CORREIA
Como é que lida pessoalmente com o falhanço quando não consegue resgatar Lido?
0:35:20 – DULCE BOUÇA
mal lido. Mal lido mal porque é assim, uma espécie de uma missão que eu pus para mim própria, de ajudar as pessoas condensas de comportamento alimentar a descobrir a vida, uma nova vida, Porque é uma nova vida que descobrem quando se tratam, E portanto quando não consigo, fico muito frustrada, fico triste, fico, Mas quer dizer? mas depois? mas eu aceito, Não posso ajudar toda a gente, só quem se deixar ajudar e só quem eu conseguir chegar até a pessoa. Às vezes posso não conseguir chegar até aquela pessoa.
0:35:54 – JORGE CORREIA
Essa temozia a pequeninho usou a palavra temozia de acompanhar o doente ou a doente, respeitando-se.
0:36:01 – DULCE BOUÇA
Tem algo, mas até morrer é.
0:36:04 – JORGE CORREIA
Sem falarmos em nomes, como é óbvio, quero partilhar alguma história que.
0:36:09 – DULCE BOUÇA
Olha uma história terrível Ah vai, os que morreram são sempre histórias terríveis, são poucos, mas há uma história incrível de uma menina com 21 anos que foi até ventrenada em Santa Maria quando eu potenciar a equipa de Santa Maria, que era uma aluna excelente universitária em uma narexia gravíssima e tinha também um lado muito crente na vida do Alem E portanto ela não queria morrer, mas se morresse era uma maneira de se encontrar com Deus e de se realizar dessa maneira. Uma pessoa muito especial, muito inteligente e que eu guardo dentro de mim E eu acompanhei-se, muito, muito doente, que me havia quilómetros e quilómetros todos os dias na cidade. Eu acompanhei essa doente durante uns dois anos e ela recuperou o peso, recuperou o estado nutricional, recuperou bem-estar, não completamente, mas recuperando, foi recuperando Até que chegou uma altura que eu disse isto não está, porque há vários parâmetros ou objetivos para se poder dizer como a narexia está tratada. Isto não está resolvido. Nós ainda há aqui muita coisa ainda para, pois, mas eu agora já não quero mais E eu disse pronto, eu cá estou.
Se algum dia quiser, volto que eu estou cá. E foi uma viagem, um caminho duro, difícil, mas proveitou-se para as duas. Desapareceu. Tinha uma relação muito próxima com os pais, que recebiam muitas vezes e vinha muitas vezes falar comigo e confiava em mim em cima e tal. E depois soube mais tarde que esta menina foi fazer, quer dizer interrompeu tudo o que era tratamento médico. Tinha a ver com o corpo, que é o tratamento de um psiquiatra, e foi fazer uma terapia psicanalítica. O que se valoriza é o que se passa dentro do corpo e não o corpo. Portanto não há nenhum psiquiatrista que pese uma doente com a narexia que falta comida.
0:38:07 – JORGE CORREIA
Não faz parte da técnica de psiquiatria Falas daquilo que pensa, daquilo que sente, daquilo que existia, daquilo que Só, só.
0:38:13 – DULCE BOUÇA
E esta menina durante o tempo. É claro que depois estas coisas vieram a saber se eu sou pelo espais, andava a ser acompanhada e começou a perder vezes, outra vez a perder, a perder, a perder, a perder. E um dia eu ia para o hospital e em Passado bem uns dois anos, encontrei ela e eu pedi, à cidade universitária, a caminhar, a caminhar, a caminhar, a caminhar, a caminhar, a caminhar, outra vez altamente desnutrida, e liguei para casa e perguntei à mãe. Eu vi a sua filha, mas tal outra vez, mal pois. Mas não conseguimos. Ela estava a fazer uma terapia. Não quer, não quer, não queria falar do corpo, ela não queria recuperar, ela tinha medo de recuperar o corpo. E portanto a doutora Dulce está sempre conosco, a sua, o seu nome está sempre na nossa cabeça. Quando ela quiser ir, ela vai, mas ela neste momento não quer mais nada.
Bom, e um dia estava eu na minha casa de fim de semana. Começava de manhã e toca o telefone e era a mãe dessa menina que me disse doutora Dulce, estamos aqui no hospital e eu vi um toalho, um toalho, um toalho. E eu queria o telefoneiro para lhe dizer uma coisa e eu vi ah, não, três dias antes a mãe disse-me vamos levá-la para o hospital porque ela desmei. Eu em casa tentei fazer respiração boca a boca, não conseguia reanimá-la. vamos para o hospital. Isto está muito mal, só para todos lhe saber. E era a fim de semana. E eu disse então quando estiver lá e quando os meus colegas virem, digam-me que, doutora, doutora, um salto aí para falar com ela. Eu tinha uma certa esperança que lhe podia transmitir um bocadinho de confiança De energia, de energia, não sei, era uma espécie minha, era uma coisa minha.
Bom, e a mãe disse está bem, quando ela já tivesse sido vista e foi para, e por favor, os posiculdades intensivos. Nós dizemos No dia seguinte a mãe liga-me e eu vi um toalho, um toalho à volta da mãe a falar e a certa altura só ouvi esta palavra autópsia E fiquei completamente gelada. Então a mãe não percebi bem, não percebi bem O que é que disse. E ela disse os médicos não perguntar se faz sentido fazer autópsia ou não. Nós não queríamos que ela fizesse. E eu disse pois isso é uma decisão dos médicos, não posso interferir nisso. Eu sei de que é que a sua filha morreu, mas não posso interferir nisso e portanto os médicos acharem que é preciso E portanto foi horrível esta experiência.
0:40:37 – JORGE CORREIA
Como é que se recupera disso? Como é que a médica recupera disso?
0:40:42 – DULCE BOUÇA
Sofrendo. Fui ao federal, fui lá, tinha um bocadinho lá o lado dela, apoiei muitos pais. Os pais depois vieram há alguns dias falar comigo. Os pais estavam cansados e exaustos deste cançados, desta doença e para os pais foi quase um alívio isto acabar. E depois, pensando nela e nas conversas tive com ela, e ela é pensando que isto foi o caminho que ela quis e tinha direito a escolher-lo.
0:41:11 – JORGE CORREIA
Tinha direito.
0:41:12 – DULCE BOUÇA
Não era o que eu queria. Deus era o que ela queria.
0:41:14 – JORGE CORREIA
Então, em os casos de grande sucesso, aqueles que dizem que isto vai ser muito difícil e depois há um clique.
0:41:23 – DULCE BOUÇA
Esses são muito bons, mas é bom ver uma pessoa renascer para a vida. Mas a principal recompensa é que uma grande maioria das pessoas que eu sigo, mesmo que estiveram muito mal depois que eu e minhas amigas E portanto depois quando tem um filho, vem me apresentar um filho quando acaba o curso, vem me mostrar, vem me pedir para assinar as fitas quando se casam. Vem e dizem que eu só vou casamento. Ele acha que estou passando por lá, mas não vou casamento, que é uma coisa de família. Mas a recompensa é essa. Mas implica-se mesmo. Ah, completamente. Aí, eu se implico-me completamente E acho que para mim não fazia sentido de tudo outro maneira, mas não sou daquelas pessoas que levem para casa os dramas das doentes. Portanto eu em casa não falo disso.
0:42:07 – JORGE CORREIA
Como é que é, como é que toma esse bem-numento?
0:42:10 – DULCE BOUÇA
Não sei, olha, não sei. Acho que a família também não tem que levar com isto. Não é Isto, foi eu que os colí. A família não tem que levar com isto.
0:42:19 – JORGE CORREIA
Como é que um psilida lida com os dias maus Ou como é que cuida da sua própria?
0:42:24 – DULCE BOUÇA
saúde, como toda a gente, como as outras pessoas todas.
0:42:26 – JORGE CORREIA
Com as melhoras que todos temos.
0:42:27 – DULCE BOUÇA
Igual e com os mesmos erros e com as mesmas falhas e com os mesmos fracasso, e com as mesmas tristezas e com as mesmas angústias e com as mesmas sensações que não consigo Igual. Somos todos iguais Humanos. Estudamos, vamos para fazer uma coisa ou desprezeiro.
0:42:43 – JORGE CORREIA
O síl humano é carregar essa condição comum, lidar com as emoções e tentar curar as feridas com o sal da vida. A ansietade permanente não ajuda, mas se calhar é a parte principal da nossa forma de expressão. Nos próximos dias, aproveitem-se puderem para ligar o vosso modo de regeneração. Aprendirem esta edição que não vale a pena perguntar se gostam de nós, mas que os abraços tenham um grande poder curativo. Pratiquei muito e partilhe em o segredo Até à próxima.